quinta-feira, 27 de agosto de 2015

O SENHOR DAS MOSCAS (1963) - zerocult #2

   Um grupo de sobreviventes de um acidente aéreo se vê isolado em uma ilha deserta tendo de lutar para sobreviver e na ausência de um poder que monitore seus atos, o lado mais selvagem de suas personalidades vai se mostrando, a razão vai sendo deixada de lado e a força e a selvageria vão dominando o grupo. Não! Não estamos falando de “Lost” , mas sim de um clássico de 1963 , “ O senhor das moscas”, dirigido por Peter Brook e adaptado do livro Homônimo de Willian Golding.
   O filme gira em torno da cisão entre esses sobreviventes em dois grupos, que começa com a apresentação dos personagens da trama. De um lado temos Ralph, que é escolhido como líder pelo voto dos sobreviventes e com a ajuda de seu colega “Porquinho”, cria leis para manter a ordem, como a obrigação de segurar uma concha para poder ter a palavra em assembléia e organização de um grupo para manter uma fogueira acesa para chamar a atenção de possíveis viajantes que passem próximo a ilha e possam resgata-los, ele é comedido e sensato e busca manter a sanidade e união do grupo; do outro lado temos Jack, líder do coral,que é arrogante e confiante,e, que aos poucos vai se destacando ao organizar os meninos do coro como caçadores, se tornando responsável pela alimentação do bando e dominando o grupo pela força. Além dos dois garotos que vão liderar cada facção, o filme ainda aprofunda dois dos personagens, ambos pertencentes ao grupo de Ralph, um deles é “porquinho”, que como comentado anteriormente ajuda Ralph na organização das regras da ilha e é a razão dentro da história, em nenhum momento ele se deixa levar pela selvageria ou anarquia que vai dominando seus colegas e sofre tanto por se manter fiel a seus valores, quanto por não se enquadrar nos padrões ditados por quem vai dominando a situação; o outro personagem é Simon, um dissidente do coral, que nos é apresentado desmaiando logo no inicio, indicando a falta de empatia pela “fraqueza” que os futuros caçadores já possuíam, ele é o tímido que não reage mas não teme, ele é a coragem discreta que paga o preço por ser diferente. Quanto ao grupo de Jack, o diretor faz questão de mostra-los como selvagens ou animais, tanto que quase não há falas destes, apenas gritos, momentos de caçadas e danças, podendo-se dizer que o grupo de Jack representa o caos mais primitivo da raça humana e que aflora sempre que não existem amarras sociais.
    Conforme os dias vão passando e as dificuldades aparecendo, o grupo vai se polarizando e esse fato é intensificado com o possível aparecimento de um monstro na ilha. A presença desse “monstro” é fator determinante para a derrocada da razão na sociedade que se forma, pois grande parte dos garotos parte para o lado de Jack por entender que apenas os caçadores são capazes de protege-los e assim o grupo de caçadores começa a desenvolver uma espécie de religião, onde a cabeça de suas caças torna-se uma oferenda ao monstro em troca de proteção. Dessa forma o poder chega as mãos de Jack através de dois pilares: A força e a religião. Essa parte da história é o ponto alto do que o autor parece querer mostrar com a máxima “O homem é lobo do homem.”, quando a força e a religião tomam o mesmo lado do poder, não há mas sensatez que possa chamar o grupo de meninos à razão e nesse momento que temos as duas vozes racionais do filme silenciadas , Simon e Porquinho, o primeiro por poder desmascarar o que se passa por trás do monstro e o segundo por confiar na razão de quem já havia sido dominado pela selvageria.
 
Porquinho e Ralph
 Ralph acaba só, ilustrando a opinião diferente que mesmo correta é perseguida em meio a involução proporcionada pelo estado de selvageria e medo da força e legitimado pela religião extrema. Podemos chamar de medo, porque vemos alguns dos meninos ainda conversando escondido com Ralph e explicando os planos de Jack, que já havia deixado uma vara afiada em duas pontas para quando o encontrasse , mas incapazes de se levantarem contra o novo líder que distribui castigos e ameaças àqueles que o desobedecem. Assim a perseguição a Ralph se intensifica culminando com o incêndio da parte da floresta onde ele se encontra e o fazendo fugir para a praia sendo perseguido pelos caçadores, o que acaba fazendo com que eles se deparem com marinheiros que ficam atônitos com a situação dos meninos, transmitindo assim o olhar da razão e sociedade e temos um close no rosto de Jack entendendo o que fez ao ter esse choque com a realidade de adultos chegando na ilha e terminamos o filme com as lágrimas de Ralph.

    O quê falar desse filme? É simplesmente um filmaço, feito em uma época em que o cinema não tratava o espectador como um imbecil e livre do politicamente correto. Há bulling com o coitado do Porquinho (até mesmo por parte de Ralph), assassinato de crianças e selvageria. O filme é um conto que ilustra um fato que sempre esteve presente em todas as sociedades que é o domínio pela força, seja esta física, religiosa ou psicológica, além de nos apresentar o processo de quebra das convenções sociais e desobediência as regras mais cristalizadas da sociedade nos momentos extremos e que se torna único por fazer isso utilizando crianças, que teoricamente, seriam as pessoas menos inclinadas para esse tipo de comportamento; além disso ainda nos coloca para refletir sobre liderança e poder.
   A direção de Peter Brook tem aquele toque clássico do final dos anos cinquenta, passando ao expectador uma tensão que 
Jack e seus caçadores
cresce aos poucos e que se torna constante no final do filme. A direção de fotografia é bem marcante, trabalhando com foco nos olhos dos personagens ou planos de seus rostos para deixar claro seus entendimentos sobre a situação, fato que é bem eficiente devido a boa atuação dos atores mirins.
    O filme conta com cenas memoráveis, como o discurso de porquinho apelando pelo retorno à razão dos colegas e os questionando sobre qual tipo de líder eles prefeririam, um sensato ou um selvagem, o que lhe é respondido de forma derradeira. Também quando um dos gêmeos mais jovens conta como foi seu encontro com o “monstro” e quando Ralph, vendo que seu poder de líder vai se diluindo, se recusa a chamar os dissidentes para não deixar claro aos outros que o grupo está se dividindo.

Como já dito antes, é um filmaço que coloca varias questões para se pensar. Tornou-se um clássico para mim em seus primeiros dez minutos e merece ser visto por todos, principalmente em dias como os de hoje, onde MAIS DO QUE NUNCA , o homem é o lobo do homem.

Quem quiser ver On-line, segue link

http://www.filmotecaonline.com.br/2015/01/o-senhor-das-moscas-lord-of-flies.html

sábado, 22 de agosto de 2015

Geração Sherlock

 Quando eu era adolescente li “um estudo em vermelho”, a primeira história do Sherlock Holmes e me diverti muito com a descrição que Sir Arthur Conan Doyle, através da boca do Dr Watson, fazia do detetive. Segundo ele, Sherlock era totalmente focado em sua ciência, sabendo tudo sobre plantas, em especial as venenosas, era tão hábil que desenvolveu um teste sanguíneo para identificar criminosos (isso no século 19), estudava a mente de bandidos para traçar paralelos, estudava os tipos de terrenos e disfarces , em resumo era um gênio de sua área e um profissional extremamente produtivo e eficaz (exceto no livro do Jô Soares, diga-se de passagem).
Nem tão competente, nem tão genial

 No entanto, conforme a história avançava e se multiplicava em outros contos eu ia observando que aquele foco extremo pelo trabalho ia se transformando em obsessão e essa em frustração, a ponto do maior detetive da literatura inglesa só conseguir relaxar através do uso de drogas, sacrificando sua vida pessoal e até sua higiene (pelo que se entende do filme do Guy Ritchie) e eu pensava: “Se fosse na vida real, esse cara morreria de infarto ou de um AVC em menos de um ano, tamanho stress que ele se cerca .”
Cool e só

  Mal sabia eu que o padrão de pessoa produtiva, mais de vinte anos após eu ler o livro, seria o padrão Sherlock Holmes, onde a sociedade cobra um foco total em algo que a gente faz, ignorando ou ridicularizando qualquer válvula de escape, qualquer momento a parte, e, assim as pessoas, frustradas e pressionadas pela obrigação social de nunca sair do personagem produtivo e genial, vão buscando em derivados de valium, prozacs e seus semelhantes, drogas menos exóticas do que as usados pelo famoso detetive, o alívio que, simplesmente ser quem são as daria. E essa falta de liberdade e certeza de uma obrigação desumana vai se apresentando a uma geração inteira como a queda d'água onde Sherlock encontrou o seu fim, nos puxando para baixo e nos fazendo desaparecer na escuridão e ruido de quem nos coloca com últimos dentre seus interesses.
Cachimbo da paz


sábado, 1 de agosto de 2015

HOMEM-FORMIGA

  Quando a Marvel estúdios anunciou que faria um filme solo do Homem-formiga eu torci o nariz, afinal, um personagem extremamente pequeno (entendeu?!) dentro do universo Marvel não deveria estrear como protagonista de um filme, ainda mais sendo esse filme o responsável por fechar a segunda fase do projeto Marvel nos cinemas e ainda por cima logo após vingadores 2 ! Mas, assim como com “Os guardiões da Galáxia” eu queimei minha língua.
  O filme conta a história de Scott Lang ( o segundo homem-formiga dos quadrinhos) interpretado por Paul Rudd, um ex-presidiário que depois de cumprir sua pena por violar uma empresa tida como uma das mais seguras do mundo, volta as ruas tentando recomeçar de maneira honesta mas sofre com a dificuldade de conseguir um emprego devido a ficha suja e com a tentação dos amigos (Luis, Dave e Kurt) em dar um grande golpe.
Melhor Poster
  Depois de perder o único emprego que consegue em uma sorveteria e ser esculachado na casa da ex-mulher quando vai visitar a filha, ele decide aceitar a ideia dos amigos e invadir a mansão de um misterioso milionário onde supostamente haveria um cofre com uma grande fortuna, sem imaginar que tudo fazia parte de um teste orquestrado por Hank Pyn (O homem-formiga original) interpretado por Michael Douglas , que busca um substituto para invadir a Cross Tecnologia, empresa presidida por Darrem Cross, seu antigo assistente e aluno que trouxe à tona o projeto de encolhimento através do protótipo de guerra chamado de jaqueta amarela, o que vinha a muito sendo mantido em sigilo por Pyn, que sempre temeu que seu projeto acabasse caindo em mãos erradas e que conta com sua filha, Hope Van Dyne (Evangeline Lilly), que espiona a Cross Tecnologia enquanto trabalha como executiva de Darrem Cross.
  Scott encontra no cofre o uniforme de Pyn e o experimentando passa por mais um teste, sendo que depois do mesmo resolve devolver o traje e acaba preso; mas Hank Pyn resolve dar mais uma chance ao protagonista e junto com sua filha resolvem trina-lo para que se torne o Homem-formiga e frustre os planos de Darrem Cross.
  Só escrevo sobre filmes se eles me agradam ou desagradam de alguma maneira e nesse caso o que posso dizer é que Homem-Formiga me agradou pela surpresa, a começar pela introdução do filme que é de tirar o chapéu, não por alguma cena explosiva ou algo parecido, mas pela utilização dos efeitos especiais e ligação que faz entre o filme e o universo Marvel nos cinemas. Nessa cena temos um Michael Douglas rejuvenescido trinta anos graças à maquiagem digital, o efeito é tão bom que dá para pensar que realmente é o filho do ator e em cinco minutos somos apresentados a personalidade explosiva do Dr Hank Pyn e os tramites de uma S.H.I.E.L.D comandada pela agente Carter e Howard Stark e que vive a paranoia da guerra fria.
 
 Outro fator positivo é o estilo comédia de ação que virou regra da Marvel após o sucesso de “Guardiões da Galáxia”, ao contrário de em “Vingadores 2” onde nem sempre as piadas funcionam, por estarem presentes em situações que deveriam ser tratadas com um pouco mais de seriedade, em “homem-formiga” as piadas parecem mais naturais, talvez pelo fato de o próprio protagonista não levar a sério seu alter ego de super-herói e também pelo elenco de apoio, como rapper T.I que faz participação como Dave um dos amigos pilantras do protagonista e consegue arrancar algumas risadas do espectador, mas o destaque é Michael Peña, que interpreta Luis ,o amigo e ex-colega de cadeia de Scott Lang; é através dele que as tramas mais absurdas são reveladas aos herói no melhor estilo “no sense” com a narração em off de cada detalhe de como surgem suas ideias, acompanhadas de interpretações literais do que o personagem fala, é hilário!
  As cenas de ação são muito bem construídas, como quando o protagonista se vê obrigado a invadir o QG dos Vingadores acreditando que se tratava de um velho depósito das industrias Stark e se diante do Falcão(Anthony Mackie) e parte para pancadaria vencendo o vingador graças ao uso de seu traje, ou quando no ato final temos o embate do homem-formiga com o Jaqueta amarela e os vemos lutar dentro de uma mala e depois em um ferrorama , quando magistralmente o diretor muda a referência ótica da cena para nos divertir com um jogo de proporção .
  Não gostei do vilão. Suas motivações são pouco claras, por vezes ele parece uma criança mimada brava com o pai, por outras uma caricata mente diabólica no pior estilo de filme dos anos cinquenta; Durante o filme algumas dicas são dadas para tentar explicar essa insanidade por parte de Darrem Cross, afirmando que sua exposição as “particulas Pyn” (formula do encolhimento) é o que o deixou insano, o que faz questionar por que apenas ele parece afetado?! A interpretação da Evangeline Lilly como a Vespa (sim! A cena pós crédito deixa isso claro) não me agradou muito também, ela parece orgulhosa e prepotente demais, até quando não está fingindo para iludir Cross e por vezes ela me pareceu desconfortável no papel, mas embora esses dois personagens quebrem um pouquinho a mágica, isso não prejudica o filme em si. Outro ponto negativo é a trilha sonora quase inexistente, se não fosse o mambo ou salsa que sobe na hora que o simbolo da Marvel aparece, eu diria que não há música no filme e isso quebra um pouco a empatia e grandiosidade em que uma musiquinha poderia dar uma turbinada.
Achei o vilão pequeno
  Achei que homem-formiga fechou bem a segunda fase da Marvel nos cinemas. Talvez a estranheza que ele tenha causado e o fato de não alcançar o sucesso financeiro pensado pelo estúdio se deva não a qualidade do filme (que ao meu ver é muito boa), mas ao universo em que ele está inserido e o que esse universo vem proporcionando ao público. Só para lembrar , o universo Marvel foi iniciado em 2008, ou seja , já são sete anos construindo histórias interligadas onde se tem no mínimo dois filmes de super-heróis por ano e a inclusão de novos heróis com suas histórias de origem podem parecer mais do mesmo para o grande público, mas acima disso, homem-formiga é uma grande filme de origem e o coloco apenas abaixo de Homem de Ferro e Guardiões da Galáxia nesse quesito. Fica agora a expectativa pela guerra civil e Dr Estranho em 2016, assim como as séries da Netflix pertencentes ao mesmo universo e que eu continue a queimar a língua quando um projeto que parece meio bobo for anunciado....mas acho que um filme do Speedball já seria um pouco de desespero, mas se lançassem, eu estaria lá para ver.