domingo, 26 de agosto de 2018

"ZULU" - O livro de Caryl Férey








     Os vilões sempre vencem! Essa frase, que se lê como easter egg em alguns episódios da primeira temporada da série “Mr.Robot”, foi a primeira coisa que passou na minha cabeça ao terminar um dos melhores romances policiais que já li até os dias de hoje, isso depois de desfazer o nó de minha garganta e contemplar o horizonte por alguns longos minutos.

   Estou falando do livro “ZULU” do escritor francês Caryl Férey, publicado no Brasil pela editora Vestígio, que tive a sorte de encontrar por acidente em uma prateleira de supermercado enquanto esperava entediado para ser atendido pelo caixa e que me apresentou uma trama tensa e pesada, com personagens carismáticos e tridimensionais, ambientada em uma país dividido por feridas do passado e a dura realidade desigual do presente que me prendeu com a garganta seca e o coração acelerado até a última linha.

  
A História, que é ambientada na tumultuada África do Sul pré-copa 2010, acompanha a equipe liderada pelo chefe da polícia criminal de Cape Town, de origem zulu, Ali Neuman, que é composta pelo jovem detetive Dan Fletcher e o complicado Tenente Brian Epkeen. A Rotina dos três, já conturbada devido a incessante violência, se complica quando a filha de um renomado jogador de rugby é encontrada morta com aterradores sinais de violência e traços de uma nova droga em seu organismo, a partir daí os três embarcam em uma odisseia que vai revelando uma conspiração tão assustadora quanto crível e que, conforme vai empilhando corpos enquanto nos conta uma história tão profunda quanto forte, entrega um olhar perturbador de um país que, tal como o nosso, é marcado pelas desigualdades e contradições.

   A primeira coisa que chamou minha atenção no livro foi a forma primorosa como o autor consegue nos colocar dentro do ambiente e das situações que vão se seguindo. Através de uma escrita ágil, mas extremamente detalhista, Caryl Féry nos leva a uma África do sul sem maquiagem, com as cicatrizes do apartheid à mostra e com todos seus problemas sociais expostos, no meio de um caos que a história só faz crescer enquanto ao mesmo tempo consegue abordar o que à de pior e de melhor nos seres humanos, em um estilo que fica bem centralizado entre um George R.R. Martin e a profundidade cinza de seus heróis / vilões e o charme e brutalidade dos detetives dos livros de James Ellroy.

    Esses mesmos personagens que, para mim, quando bem escritos são o segredo da qualidade de qualquer grande obra literária ou cinematográfica, são a segunda coisa que me fisgou no livro. E a maneira como o autor dá um mínimo de profundidade a todos eles, os apresentando em pequenos capítulos que dão uma ideia geral de sua personalidade e seus motivos, quando não contando mesmo suas biografias e o que aconteceu para que eles tivessem chegado até aquele momento da história, facilita essa percepção de relevância de cada um deles. É assim que conhecemos o terrível passado de Ali Neuman, sobrevivente dos últimos dias de Apartheid e que presenciou o assassinato do próprio pai e do irmão mais velho; Do mesmo modo descobrimos sobre as origens africânderes do rebelde Tenente Epkeen, de seu desprezo pelo sistema e relação conturbada com o filho e a ex-mulher, essa mesma tendo um grande destaque na última parte do livro; Ou ainda nos emocionamos com a relação do policial Dan Fletcher com sua esposa com câncer e o medo de deixar seus filhos desamparados; tudo isso em meio a outras tantas histórias e personagens que compõem a trama. Férey descreve tão bem esses personagens que mesmo antes de terminar a primeira parte do livro já fomos pegos nessa armadilha que acabamos nos sentindo tão íntimos deles que sentimos seus medos, nos entristecemos com suas frustrações e tememos por suas seguranças a qualquer sinal de ameaça.

  
O Autor
E Ameaças é o que não faltam em um país que, assim como o Brasil de 2018, parece uma bomba prestes a explodir. São gangues de ex-milicianos oriundo do coração da África, traficantes que se escondem em seus bares particulares e nas favelas, a AIDS, a falta de perspectiva, mas é no grande mercado (sem spoiler) que reside o grande antagonista à equipe de Ali e que, assim como em muitas situações da vida, ao final do livro, deixa aquele gosto amargo em nossa boca quando percebemos que, mesmo presos ou mortos os assassinos e envolvidos, o mal que gerou todas aquelas situações e precisou de tantos sacrifícios para ser freado, jamais será levado à justiça, nos deixando apenas o consolo da vingança contra seus agentes mais próximos e tristeza por quem buscou justiça e caiu em batalha.

    Mas mesmo terminando com um soco no estômago, a ponto de colocar um nó na minha garganta e um amargo na boca por todos os sacrifícios feitos pelos personagens (em especial ao final da primeira parte e do último capítulo), a leitura de “Zulu” me proporcionou uma grande prazer. Por seus personagens humanos e realistas, a Trama investigativa extremamente inteligente e clima de reflexão social pertinente e assustadora (e que, em alguns aspectos, lembra muito nosso país) indico a todos que desejarem uma história cheia de reviravoltas e que estejam dispostos a ir até aos esconderijos mais sombrios e sujos da mente humana, mas sempre com a verdade em mente de que os vilões sempre vencem.



sexta-feira, 10 de agosto de 2018

JACKIE BROWN (1997) - e os ciclos que regem nossas vidas.




 
    Somos prisioneiros de ciclos. Acreditamos que o tempo simplesmente se desloca em linha reta do passado para o futuro e que o presente é uma constante novidade, mas na verdade seguimos vivendo ciclos que se repetem e se repetem sem que muitas vezes nem percebamos.    
  
Então um dia você acorda com quarenta e poucos anos e as coisas ainda estão iguais a como eram quando tinha vinte, se frustrando em empregos que eram para ser temporários, cometendo os mesmos erros na vida amorosa, enfim, patinando em todas as áreas da vida por não conseguir quebrar essa prisão temporal que acreditamos se tratar apenas de rotina. Mas, se no meio desse caos você percebesse que a repetição ou não dependesse de uma atitude perigosa contra todas as ações que você insiste em aceitar, você estaria disposto a correr os riscos?
  
Pois disfarçado de filme de golpe, com todos os ares de blaxploitation, e abordando sobre o que a quebra ou aceitação dos ciclos da vida podem definir na vida das pessoas, estreava no Brasil em 1998, “Jackie Brown”, filme roteirizado e dirigido por Quentin Tarantino, estrelado pela estrela dos filmes negros dos anos 1970 Pam Grier e baseado no livro “Rum Punch” do escritor Elmore Leonard, que depois de vinte anos parece se firmar, para mim, como o melhor filme do diretor e conversar com momento de encruzilhada da minha própria vida.

   Para quem não conhece o filme, a história conta as desventuras de Jackie Brown (Grier) uma comissária de bordo de uma pequena companhia aérea Mexicana que, para conseguir ganhar alguma grana a mais, contrabandeia dinheiro para o traficante de armas Ornell Robbie (Samuel L. Jackson), No entanto, após ser descoberta e presa pelo agente da ATF Ray Nicollete (Michael Keaton), Jakye, começa a temer mais pelo seu futuro sem perspectiva do pelo risco de seu contratante a achar uma dedo-duro e concebe um perigoso plano para se livrar de Ornell, das acusações e alcançar certa estabilidade financeira, virando em 180° a vida que parecia ser seu destino. 

   Como eu disse acima, não percebemos que estamos presos a ciclos até que uma situação externa bata com força em nossa cara. Foi exatamente isso que aconteceu comigo, quando em uma tarde de domingo chuvosa resolvi reassisti ao terceiro filme de Tarantino e sentir como se alguém gritasse dentro da minha cabeça se eu estava entendendo a mensagem. Todos os personagens centrais da história estão às portas de repetir seus ciclos de vida ou quebra-los e a atitude que tomam frente a isso é o que define seus destinos.

  
Gara
Começamos com a protagonista, Jackie Brown, que durante a trama confessa que já foi presa anos antes também por contrabando e que depois de um tempo na cadeia, amargou anos de condicional, o que parece tê-la quebrado, fazendo-a se resignar com o pouco que conseguiu depois. Ela mesma confessa ao agente de fiança Max (Robert Forster) que parece estar sempre recomeçando e que se encontra cansada disso. Sua quebra de ciclo ocorre quando, após se ver pressionada pelo flagrante do agente da ATF, resolve ir de encontro as suas antigas decisões e tomar o protagonismo de sua própria vida, utilizando de sua esperteza e charme para se impor ao que parecia ser seu destino, o que resulta em sua libertação e o alcance do que esperava para si.

   O contrário ocorre para o restante dos personagens da trama; que por receio, medo ou costume sofrem as consequências de se manter presos à suas jornadas. Dois casos distintos são claros dentro da história, o do ex-presidiário Louis Gara (Robert De Niro) e o Agente de Fiança Max Cherry (Robert Forster).
   Louis Gara não consegue fugir de si mesmo, como se a prisão da qual foi liberto ainda o acompanhasse. A primeira coisa que vemos do personagem no filme é ele retornando ao mundo do crime sob a proteção de seu amigo Ornell e embora sempre transpareça confusão e por vezes apatia em relação aos assuntos do parceiro, não move um musculo para mudar sua perspectiva, o que com sua participação ao final da trama se pode encarar como medo, um medo tão grande que se transforma em violência e inconsequência, selando seu destino de forma definitiva.
Jakie & Max

   Por outro lado, Max Cherry está completamente fundido a sua rotina. Agente de fianças há mais de vinte anos, sem família e, aparentemente sem amigos, sua rotina é sua vida. Mas ele tem um vislumbre de que as coisas podem ser diferentes ao conhecer Jackie e se apaixonar pela mesma, tanto que após criar certa intimidade com a protagonista confessa a ela que irá se aposentar, pois não vê mais sentido nas repetições em sua vida profissional. Entretanto, a insegurança em sair de uma longa rotina o impede de seguir seu desejo e o que vemos dele ao final, quando vê Jackie partindo, é o semblante de quem levará consigo para sempre a dúvida do que poderia ter sido e nunca foi.
  
   O que difere Jackie Brown dos demais personagens do filme é ter entendido que só se pode seguir em frente quando destruímos o caminho antigo e criamos um novo; Gara, Cherry, Ornell e os outros personagens parecem não compreender esse fato e fecham o filme ou ruminando os mesmos problemas ou simplesmente mortos, enquanto Jackie termina a história protagonista tanto da trama quanto de sua própria vida.

   Me identifiquei no ato ao reassistir “Jackie Brown”. Com trinta e sete anos, doze destes no mesmo emprego, relacionamento cheio de idas e vindas e ainda pensando o que querer da vida me fez pensar em como acabamos tranquilamente aprisionados nos ciclos que criamos para nós e isso me fez voltar a escrever, o que é um pequeno passo, mas já me tirou da inércia. Meu convite é para que todos revisitem o terceiro filme de Tarantino sob este ponto de vista de recomeços e fugas dentro das vidas dos personagens, mas isso não interessar, assista assim mesmo, focado no charme de Pam Grier, na trama cheia de reviravoltas ou nos diálogos extremamente humanos, quebrando pelo menos o ciclo da mesmice dos blockbusters atuais.

                            

terça-feira, 19 de junho de 2018

BALA DE PRATA (1985) #Zerocult 7





Fiquei empolgado com o filme brazuca “As boas maneiras” e seu ponto de vista original da maldição do lobisomem. Tanto que queria transformar o mês de junho no mês da licantropia aqui no blogger e para isso resolvi assistir aos filmes que abordassem a mesma temática e que marcaram minha juventude. No entanto, revisitar o cinema dos anos oitenta pode ser tão perigoso quanto sair para passear pelos bosques do Maine em noite de lua cheia, principalmente se o primeiro filme a ser revisitado for baseado em um livro de Stephen King e roteirizado pelo mesmo.  
linda capa do VHS
Sim! Hoje falaremos sobre um clássico do extinto “Cinema em casa” do SBT, “Bala de prata” de 1985, baseado no livro “A hora do lobisomem” do Rei do terror e “estrelado” pelo eterno, mas já falecido, ator mirim Corey Haim; que, após ser reassitido substituiu em mim todo terror de quando eu tinha doze anos por momentos de humor e até de certa vergonha alheia, mas sem com isso destruir a gostosa sensação de nostalgia.

O filme acompanha Marty Coslaw (Haim), um menino paraplégico de doze anos, que junto com sua irmã Jane (Megan Follows), após perderem um amigo, a descobrem que a série de assassinatos que vem acontecendo na cidade onde moram, a pequena e pacata cidade de Tarker’s Mill no Maine, é obra de um lobisomem. Os irmãos agora terão de encontrar um adulto que acredite neles e buscar descobrir quem é a pessoa que carrega a maldição.

Lembro quando assisti “Bala de prata” pela primeira vez! Eu devia ter um pouco menos que idade do protagonista e mesmo o filme passando às duas horas da tarde, não nego que a ideia da trama trazer um guri paraplégico fugindo de um lobisomem em uma cadeira de rodas motorizada no meio dos bosques de uma cidade no interior do interior dos EUA, me assustou bastante. No entanto, rever esse filme mais de vinte cinco anos depois, impressiona como muitos dos filmes oitentistas, diferente de alguns clássicos, mas muito parecidos comigo envelheceram mal, embora continuem divertidos.

O lado divertido do filme é a já mencionada nostalgia no melhor estilo “Stranger Things”, que faz quem tem mais de trinta anos, olhar com carinho todas as extravagâncias da história e relembrar um tempo mais ingênuo e sem o bombardeio de informações que sofremos hoje, onde ainda era possível soltar pipa na rua até de madrugada, ou sair à noite para detonar fogos de artificio ou coisas que o valham. Sem contar que o filme tem uma vantagem sobre as produções modernosas, que é o simples fato de que, diferente da série do streaming mais famoso de todos os tempos, toda aquela breguisse não é emulada, mas real! O filme desenhava um retrato do momento onde foi produzido, o que serve para os jovens matar a curiosidade de como era um mundo sem internet, TV a cabo, celulares e videogames.

De zero a cem em 5.8 segundos!
Mas o que me fez assistir a esse “clássico” até o fim com um sorriso no rosto foi seu lado ruim, que é o roteiro.  Se há uma coisa que eu adoro, são filmes “ruins bons”, aqueles filmes que são produzidos de maneira séria, mas que devido aos cacoetes de seus diretores ou deslize de seus roteiristas agregam certos absurdos que o destacam em meio a tantas outras obras. “Bala de prata” não é diferente, além de trazer todos os estereótipos de filmes de adolescente dos anos oitenta, como o protagonista sendo visto como diferentão (nesse caso deficiente), a irmã que quer ser popular, O tio perdedor e bêbado que é o único que acredita nas crianças e os pais ausentes, nenhuma situação ocorrida no filme parece ter um porque e o questionamento que isso gera rendem bons momentos.

Exemplos dessas situações, que são o tempero da trama, estão todas ligadas ao próprio Lobisomem, em especial a sua aparição na cidade. (SPOILER À FRENTE) O Lobisomem é o reverendo da cidade (pronto falei) e após algumas mortes em seu currículo, o vemos tendo um pesadelo onde todos de sua paróquia (que toda noite se reúnem para cantar “Amazing grace” ) se transformam em lobisomens e partem para cima dele e ele acorda pedindo a Deus para que a maldição acabe, o que nos induz a pensar que a maldição é , de alguma forma, divina; eu mesmo cheguei a achar que a transformação tinha algo a ver com os pecados de alguns habitantes, pois a primeira vítima é um alcoólatra que batia na mulher e a segunda uma suicida, mas todas as teorias caem por terra, após a irmã do protagonista expor a ideia de que talvez nem o próprio reverendo saiba o porquê das transformações, o que confirma com o mesmo, logo depois, tomando para si a postura de vilão e deixando qualquer resposta apenas na especulação.

"alguém sabe onde encontro um Chapel XXXL?"
Outra coisa maluca que se soma as excentricidades do roteiro é a decisão genial do casal de irmão de chantagear o reverendo/lobisomem via cartas com letras recortadas de revistas, pedindo educadamente para que ele se retirasse da cidade, o que não dá muito certo. Mas esse “deslize” dos irmãos é pinto perto da ideia fantástica de um grupo de cidadãos indignados que decide caçar o “maníaco do bosque” à noite no meio da floresta, portando espingardas e bastões de baseball e a cena que se segue com o lobisomem batendo em um deles com um bastão até a morte (Sim! O lobisomem mata um cara com um bastão de baseball!), fato que gerou a capa do VHS do filme com uma mão peluda e com garras segurando um bastão para duas crianças amedrontadas. E nem vou comentar sobre a piadinha do protagonista ao final sobre sua própria deficiência. Isso, meus amigos, são os anos oitenta!

Apesar das loucuras, ou melhor, graças a mesmas, adorei ter revisitado “Bala de prata”, fez lembrar um tempo mais leve da minha vida, onde os monstros eram pessoas com uma roupa de pelúcia e uma cabeça enorme de lobo, quando não um cara grande com um facão e uma máscara de hóquei e não frustrações que se acumulam e boletos que se empilham. Um clássico do cinema em casa capaz de trazer a nostalgia com força e arrancar gargalhadas de doer a barriga, mas não sem conseguir dar os sustos que promete.

Então, se tiver mais de trinta e cinco anos e quiser assistir a algo que lembre a infância, procure por “Bala de prata” e deixe sua mente passear livre pelos anos oitenta por noventa minutos e aproveite o mês do Lobisomem.

Só tome cuidado com a Lua.

             

quinta-feira, 14 de junho de 2018

AS BOAS MANEIRAS (2018)




Em junho de 2016, Após assistir o ótimo filme argentino "Relatos selvagens", eu questionava o porquê o Brasil não produzia cinema no mesmo nível de nossos vizinhos Hermanos, que conseguem entregar bons filmes com temas variados, sem se prender aos problemas existenciais de sua classe média ou a violência que a pobreza enfrenta; a opção que encontrei na época passava pelas produções autorais e de menor orçamento, como por exemplo, os curtas de terror de Dennison Ramalho, mas o pouco alcance desse tipo de produção veio depois a me parecer um caminho estreito demais para fomentar investimento e qualidade em nossa indústria cinematográfica, que necessitava de algo maior para se tornar visível.

Dois anos depois, a semente desse cinema de nicho que eu havia enxergado como opção parece ter começado a germinar com a estreia de um filme que foge do que é comumente feito no Brasil ao misturar elementos de terror sobrenatural e crítica social, além de inovar em sua narrativa e plasticidade. Trata-se de "As boas maneiras", filme  de Juliana Rojas e Marco Dutra, estrelado por Marjorie Estiano, Izabel Zuaa e Miguel Lobo, que estreou dia sete de Junho,  podendo ser aquele algo a mais que trará um novo frescor a industria cinematográfica BR.


  

O filme, que se divide em duas partes, acompanha a história de Clara (Izabel Zuaa) uma melancólica enfermeira, que é contratada para "ajudar" na casa e ser a babá do filho ainda não nascido de Ana (Marjorie Estiano) e que , conforme a relação das duas vai se estreitando, começa a notar o estranho comportamento de sua empregadora em noites de lua cheia e procurar por respostas. Já na segunda parte, encontramos Clara, quase dez anos depois, muito mais confiante e morando na periferia com seu filho adotivo Joel ( Miguel Lobo) que guarda um segredo que o impossibilita de aproveitar ao máximo sua vida e que põe tudo em risco quando descobre o que Clara escondia de seu passado e parte para a cidade em noite de lua cheia.

Embora na minha sinopse a trama pareça dar toda atenção a uma história clássica de lobisomem, o filme na verdade segue a cartilha de toda boa história de ficção científica ou fantasia e usa esse elemento fantástico muito mais como plano de fundo para expor de forma sutil os problemas de nossa sociedade, do que aborda a lenda e maldição da licantropia. Sendo assim, "As boas maneiras" é mais um drama que fala de amor, sacrifício e tolerância, do que um filme de monstro pensado para dar sustos.

Clara e Ana
Podemos constatar o comentado acima apenas analisando o próprio nome do filme, que faz alusão a uma conversa que Ana tem com Clara, quando esta lhe serve sopa no jantar e que a remete a aulas de etiqueta que ela fez quando era mais nova. Ana conta que era ensinada a tomar sopa sem fazer barulho e andar com um livro na cabeça para treinar a postura (coisa que ela não consegue quando tenta demonstrar, indicando sua falta de aptidão para fugir de quem realmente é ) essa conversa, que pode passar despercebida, descreve toda a dura relação dos personagens centrais com a sociedade que as rodeia e a qual tentam se adaptar e manter com o máximo esforço a convenções, seja a mulher negra, pobre e lésbica, que tem que se sujeitar a acumular tarefas em um emprego para poder pagar suas contas, seja a mulher rica, que seguindo seus desejos é renegada pela família e expulsa de sua casa por desonrar seu nome ou a criança que, sem conseguir escapar de como nasceu, é trancada em um quarto blindado em noites de lua cheia. Todos ali são párias, por não conseguir fingir por completo suas naturezas, por não seguir as boas maneiras.

Podemos até mesmo traçar um paralelo entre o aparentemente frágil Joel com a história de muitas crianças e jovens das periferias. Criado na pobreza se sente abandonado e se vê impossibilitado de participar das experiências que a vida lhe mostra devido à condição em que nasceu. Como no caso de muitos desses jovens a revolta também é o escape de Joel na busca por liberdade e o erro fruto da falta de conhecimento sobre si mesmo, o que, aos olhos da sociedade, o apaga como pessoa e o enxerga apenas como um monstro.

Eu era um lobisomem juvenil
Mas longe dessas interpretações subjetivas, o filme me surpreendeu, além de pela história com pitadas de terror e o aprofundamento dos personagens; pela sua estética e inovação na narrativa. A forma como o filme mostra São Paulo dividida entre uma zona de arranha-céus espelhados e uma periferia imensa e a transformação de menino para monstro quando ele atravessa a ponte; as ruas escuras cheias de luminosos dão um ar de cinema coreano à película e os efeitos especiais bem bacanas para nosso pobre cinema além de não decepcionar prestam homenagem ao clássico “Um lobisomem americano em Londres”, sem contar que no primeiro ato, temos a história de Ana sendo contada através de desenhos e no ato final ainda vemos um trecho musical, nada descambando para cafonice ou galhofa.

No entanto, como tudo na vida esse filme também tem seus problemas, e, um dos que mais me incomodou foi a extensão da história. A produção tem duas horas e dez, o que não é lá um grande tamanho, no entanto, se tratando de uma história que foca em apenas três personagens, parece que há uma barriga desnecessária na trama. Há também algumas falhas de roteiro que não me passaram como o fato de ninguém vir atrás do menino Joel, quando este é levado por Clara ou como ela construiu um quarto blindado no fundo da peça onde morava. Mas todos esses pequenos problemas não apagam o mérito e o marco que o filme é por fugir da mesmice.

Apesar de seus pequenos problemas, “As boas maneiras” estreia trazendo novos ares para o cinema brasileiro e abrindo portas para temas mais diversos e fantásticos produzidos em nossas terras tupiniquins, injetando qualidade e quem sabe fazendo com que surjam investimentos suficientes para que nossa indústria se torne rentável e assim independente do estado e, finalmente, deixar de ser esse monstro assustador que só aborda as misérias da pobreza ou cinebiografias e conseguir alcançar o mesmo nível  e qualidade do cinema Argentino.




terça-feira, 29 de maio de 2018

Mortes em "Vingadores: Guerra Infinita".Quais os reais motivos.






Passou-se um mês da estreia de “VINGADORES: GUERRAINFINITA” e acredito que quem se interessou pelo destino dos personagens já deve saber que uma grande parte deles vai à Óbito durante a trama. No entanto, o que pouca gente sabe é que aquele discurso furado do vilão Thanos, afirmando que, para o universo progredir seria necessária a extinção de uma parte da vida de forma “aleatória” é uma grande mentira e que (quase) TODOS personagens mortos tiveram grandes motivos para suas desintegrações.
Para acabar de uma vez por com esse embuste proveniente da mente vingativa e inquisidora de um personagem de CGI, venho hoje revelar os pecados que levaram os heróis tombados até seu triste destino: (clique no nome do "motivo" para ver o trailer)

Gamora - MOTIVO: Crossroads (2002)
  Em 2002 a Diretora Tamra Davis trazia a público um filme onde, três amigas de infância partem em uma viagem pelos EUA para experimentarem pela última vez toda liberdade do final da adolescência e reafirmar os laços de sua amizade (vômito!), Sim, estou falando de “Crossroads: amigas para sempre”, filme protagonizado por Britney Spears (pré-surto) que tinha como uma de suas best friend , Zoe Saldaña, que antes de viver a badass Gamora, chorava sentada na beira de uma fogueira porque: “minha mãe me odeia porque sou mais bonita que ela!”... Confessa, tu também não a jogarias de um precipício?

Falcão – MOTIVO: Sem dor, sem ganho (2013)
Acho importante filmes baseados em fatos reais, pois quando bem escritos geram o desejo das pessoas conhecerem mais sobre história e fatos que perturbaram a sociedade. No entanto, quando uma situação na é deturpada na trama e tenta transformar um crime em uma comédia e assassinos em trapalhões marombados, não dá para perdoar. Pois é assim o filme “Sem dor, sem ganho” dirigido pelo famigerado Michael Bay e que, através uma espécie de comédia de mau gosto, conta a história do grupo chefiado por Daniel Lugo, um personal trainer, que resolve pular algumas etapas de sacrifício do sonho americano de enriquecer e sequestrar e matar para ter uma vida mais confortável; Nesse grupo dos amigos de Lugo, temos Anthony Mackie, o Falcão, parceiro fiel de Steve Rogers e que Thanos mandou para terra dos pés juntos sabendo que não se deve dar asas a cobras.

Pantera Negra – MOTIVO: Deusesdo Egito (2016)
O Filme Pantera Negra foi a mais feliz surpresa deste ano, dando uma aula de representatividade e carisma sem deixar a diversão de lado.Mas o que poucas pessoas devem lembrar é que antes de Chadwick Boseman viver o protagonista do segundo filme mais rentável da Marvel em 2018, ele viveu o Deus Thot em “Deuses do Egito”, um filme que , apesar de um elenco fantástico, trazia efeitos visuais vergonhosos, atuações vexatórias e um roteiro capaz fazer a própria esfinge enfiar a cabeça nas areias do deserto, justificando a morte do nosso querido príncipe T’challa.

Groot – MOTIVO: Triplo x (2002) & Tripo X –REATIVADO (2017)
Matar (de novo) o Groot parece uma tremenda sacanagem, mas ao lembrar que o responsável pela voz da carismática Árvore-humanoide é o Brucutu Vin Diesel e de suas interpretações canalhas na franquia triplos X (sem dizer de todos outros filmes), penso que ficou barato o que aconteceu com ele.


Star Lord – MOTIVO: O Procurado (2008)
Em 2008, os filmes de Super-Herói teriam uma revolução com a estreia de Homem de Ferro! Só que naquele mesmo ano, outro filme “baseado” em uma HQ estreou sem causar grande alarde, era “O procurado” que ficou marcado na memória coletiva da humanidade devido a suas balas atiradas em curva e assassinos contratados através de uma maquina de tear (não lembra? É porque o filme é ruim!). No elenco dessa maravilha, tínhamos o engraçadinho Chris Pratt, no papel do melhor amigo traíra do protagonista que ficou na minha memória por esse filme por levar com um teclado no meio da cara, o que Thanos achou pouco.

Dr Estranho – MOTIVO: O Quinto poder (2016)
Em 2013 chegava aos cinemas a cinebiografia de Julian Assange e a história da Wikliakes, e, o que era para ser uma empolgante história baseada nos eventos recentes de exposição e documentos secretos, se apresentou em um filme morno e chato que passou quase que despercebido e foi um fracasso de bilheteria, não podendo nem mesmo contar com a magia de Benedict Cumberbatch para que o filme tivesse um pouco mais de brilho, fato que, no meu coração, foi decisivo no destino do Dr. Estranho no final de “Guerra infinita”.

Drax – MOTIVO: O homem com punhos de ferro (2012)
Em 2012, o raper RZA realizou seu sonho de moleque de escrever e dirigir um filme de Kung-fu... e o filme é uma bosta! Totalmente filmado em estúdio, com personagens caricatos e idiotas e uma trama sem sentido, “O homem com punhos de ferro” é uma comédia involuntária de fazer a barriga doer de rir. Nesse pastelão, encontramos Dave Bautista (O Drax) começando suas aventuras no cinema depois de sua saída do WWE e interpretando um vilão tão meia boca que o desempenho o indicou como mais uma vítima de Thanos seis anos depois.

Feiticeira Escarlate , Mantis e Nick Fury – MOTIVO: Old Boy (2013)
Em 2002 o cinema Sul-Coreano chamava a atenção do mundo por uma Obra prima que abordava vingança, loucura e violência de uma maneira maravilhosamente Original, se tratava do novo clássico “OldBoy”, do diretor Park Chan-wook. Onze anos depois, o filme ganhou um remake desnecessário ambientado em terras americanas, onde a trama foi reduzida, os conflitos simplificados e a história que era densa transformaram em um filmeco de ação totalmente esquecível para nós, Mas não para o Titan louco!! Até por que Josh Brolin (que interpreta Thanos) é o protagonista desta droga e, talvez até por isso, tenha mandado para a terra dos pés juntos três infelizes que também estavam no filme... Samuel L. Jackson (Nick Fury) que fazia o papel do carcereiro do protagonista, Pom Klementieff (Mantis) que faz a guarda costas do antagonista e Elizabeth Olsen (Feiticeira escarlate) que faz a filha do protagonista. Mortes merecidas.

Soldado Invernal & Homem–aranha: Como em toda Guerra existem injustiças ... para não dizer que toda guerra é injusta... Talvez por isso o Soldado Invernal e o Homem-Aranha tenham ido a óbito, pois nada justifica a morte dos dois... não lembro de nenhum filme, série ou tweet que justifique a morte de ambos, apenas o recado implícito de que coisas ruins podem acontecer para pessoas legais... Ou talvez por um ser um adolescente chato e o outro um ex-assassino de um grupo terrorista... Mas acho que foi injustiça de guerra mesmo.

Bom, os pecados que levaram os muitos dos vingadores a morte foram expostos, desmentindo o discurso de aleatoriedades na escolha de quem vive ou quem morre proferido pelo vilão Thanos, só não consegui entender porque o capitão América não morreu, mesmo seu interprete sendo o mesmo do “Tocha-humana” dos dois primeiros filmes do Quarteto Fantástico, ou mesmo a  Viúva Negra, depois que Scarlett Johansson fez “Sob a pele” e “Lucy” , mas como dizem, gosto é gosto e não chamam Thanos de “O Titan louco” à toa.


sexta-feira, 18 de maio de 2018

DEADPOOL 2 (2018)






Chegou aos cinemas Brazucas nesse dia 17 de Maio do ano da graça do nosso senhor Jesus de 2018, “Deadpool 2”, a continuação do surpreendente sucesso  de 2016 estrelado por Ryan Reynolds na pele do mercenário tagarela mais querido da Marvel e, antes que o meu poder mutante de dizer que ESSE FILME É MELHOR DO QUE “GUERRA INFINITA” e repetir à exaustão as piadas com o universo DC comece a falhar, garanti meu confortável lugar no cinema para poder expressar minha desinteressante opinião sobre esse filme que é um dos mais esperados pela galerinha que curte uma cultura pop.

Na história, Wade Wilson /Deadpool (Reynolds) segue sua vida rotineira como assassino profissional, tendo o taxista Dopinder (Karan Soni) como motorista e o barman Fuinha, como conselheiro e agente; tudo segue “Tranquilamente” até que uma emboscada arranca de seu coraçãozinho imortal seu motivo para viver. É quando, Preocupado com a situação de nosso herói, Colossus, o mais camarada dos x-men, resgata Wade de sua jornada de autodestruição e o junta à equipe do Professor Xavier, só que em sua primeira missão, o mercenário se depara com um jovem que se intitula “Firefist”, com quem, após ouvir sua história e acabar indo preso junto, desenvolve uma relação de amizade baseada na total falta de noção. Nesse exato momento, mas no futuro (por menos lógico que isso pareça), o misterioso e letal Cable (Josh Brolin) se prepara para retornar para o passado, para se vingar do responsável pela morte de sua família, o psicopata conhecido como ... “Firefist” (ele mesmo, o moleque esquentadinho). Resta então a Deadpool formar uma equipe de “elite” para resgatar o jovem amigo e convencer Cable de que o futuro pode ser mudado, com muito tiro, porrada, bomba e uma dose cavalar de humor negro.

O filme é muito bom, mas o que tem de melhor é que ele dá continuidade ao estilo que resultou no sucesso do primeiro e ainda cresce expandindo o universo centrado no protagonista, abrindo as portas cinematográficas e dando destaque a personagens intimamente ligados a ele nas HQ’s, como Cable e Dominó, assim como acerta em corrigir a imagem de outros personagens que, tais como  o próprio Deadpool em “X-men Origens:Wolverine”, foram sacaneados em filmes anteriores.

Quanto à introdução de Cable e Dominó no cinema, gostei mais da sortuda e carismática mutante do que do carrancudo viajante do tempo. Dominó tem uma crescente no filme bem bacana, onde surge na entrevista de candidatos para o time de resgate de forma despretensiosa, dizendo que a sorte a levou até ali e que esse era seu superpoder, levando a uma discussão infantil de uns três minutos com o protagonista, sobre o fato de a sorte ser ou não ser um superpoder; o que vemos ser comprovado, quando no ato do resgate, tudo que é preciso acontecer para que ela consiga sucesso, acontece mesmo e em cenas muito bem construídas e divertidas. Cable, por sua vez, embora não decepcione com a aparência idêntica a das HQ’s e seu estilo durão, e, tenha um bom motivo para voltar no tempo, deixa muitas questões em aberto, como, por exemplo: - Se qualquer um (pois ele parece ser um “qualquer um”) tem acesso a um dispositivo de volta no tempo, por que ninguém voltou antes e acertou o passado? Contra quem ele lutava no futuro? Ele é um mutante igual nos quadrinhos? Se sim, quais seus poderes, já que ele só aparece utilizando armas? Perguntas que não possuem respostas no filme e que parecem deixar o personagem um pouco solto; questões que podem vir a ser uteis quando se pensa que a origem do personagem pode ser melhor aprofundada no spin-off “X-Force” já confirmado pela FOX, mas que faz falta nesse filme.


Já sobre as correções com os personagens que foram injustiçadas antes, os grandes representantes dessa volta por cima que o filme oportuniza são o Colossus, que já havia ganhado um destaque no primeiro filme e que retorna ainda mais bacana e carola e o vilão Jugernaut ou Fanático (como chamamos aqui em terra brazilis) que surge como uma surpresa no meio da trama para incendiar a situação. Juntos, esses pesos pesados se destacam no terceiro ato em uma cena de porradaria com franca trocação, recuperando a honra de um Colossus que não tinha o menor carisma e que quase nem falava em “X-men 2 e 3” e que só apanhou em “Dias de umfuturo esquecido” e de um Fanático vergonhoso de “X-men 3” que só corria e quebrava parede, sendo derrotado pela Kitty Pryde e o sanguessuga.

Mas não podemos parar de falar dos grandes destaques do filme sem citar a “X-Force” formada no filme. Com mutantes de segundo escalão do naipe de “Zeitgeist” que vomita ácido (interpretado por Bill Skargard); “Bedlam” que cria um campo bio-elétrico capaz de influenciar máquinas e o cérebro humano (Interpretado por Terry Crews); Peter, que é só um cara normal, além de ShatterStar e Vanisher, a equipe se apresenta como o grupo mais fadado ao fracasso e azarado de todos os tempos e sem o menor motivo para ir lutar, em uma ponta (por assim dizer) que consegue ser a coisa mais frustrante e ao mesmo tempo a mais genial aula de humor negro da história dos filmes de super-heróis, me arrancando gargalhadas de nervosismo. (Não estragarei a surpresa, mas só digo uma coisa se tratando da “X-Force”: Não acredite nos trailers).

Mas apesar de tudo de bacana que o filme tem, ele possui seus defeitos. O maior, a meu ver, como citei acima, são as motivações de alguns personagens, tais quais os membros da primeira formação da “X-force”, que vão surgindo após uma anuncio e partem para uma missão maluca de resgatar um desconhecido de um comboio que leva os mutantes mais perigosos para ser congelados em animação suspensa sem a garantia de uma recompensa ou mesmo de vida; coisa parecida que acontece com o Fanático, que se apega ao jovem Firefist e resolve ajuda-lo a se vingar sem nenhum retorno aparente, isso tudo sem contar que uma das cenas pós-créditos destrói todo o crescimento que o personagem tem durante a história e até a decisão de Cable em ficar no presente, mas que mesmo assim, é muito bacana. Mas o que eu queria né? É um filme do Deadpool, constância e sentido não são os primeiros itens que devem ser levados em conta e sim o sangue e a zoação e nessas questões, o filme não erra em nada.

“Deadpool 2” é tudo que foi prometido na cena pós crédito do primeiro filme e em seus próprios trailer (menos no que diz respeito a X-force), sendo melhor que “Guerra infinita” , “Jogador n°1” e ficando abaixo de “Pantera Negra” apenas por não transmitir uma mensagem tão poderosa quanto a do filme do rei de Wakanda e trilhar o caminho da zoeira. Um filmaço que consegue misturar com pontualidade humor e ação, se tornando o segundo melhor filme dentro do universo mutante (depois de Logan) e certamente o mais maluco e divertido filme baseado em quadrinhos de 2018.



quinta-feira, 10 de maio de 2018

THE TERROR (2018) - A série




    19 de Maio de 1845. O Terror e o Erebus, dois dos navios mais bem equipados da marinha Britânica, partiam da Europa em direção ao circulo polar ártico na intenção de descobrir a tão sonhada “passagem do Noroeste”, uma rota navegável que ligaria o atlântico norte ao oceano pacífico, facilitando a busca de especiaria e o comércio com o Oriente. Tendo o experiente explorador Sir John Franklin, veterano de outras três missões ao continente gelado, como comandante da expedição e como capitão do HMS Terror, Francis Krozier, do HMS Erebus, James Fritzjames e possuindo uma tripulação conjunta de cento e trinta homens, ambos os navios foram avistados por barcos baleeiros na bahia de Baffin em Julho do mesmo ano, aguardando o melhor clima para adentrar o labirinto gelado do mar do polo norte, depois daquele dia ambos navios e seus tripulantes, nunca mais foram vistos.

   Inspirado nessa assustadora e fascinante história real, o escritor americano Dan Simmons publicava em 2007 o livro “O Terror”, misturando as mais recentes descobertas sobre o possível trágico destino dos marinheiros ingleses com uma assustadora trama sobrenatural que transita entre a misteriosa mitologia Inuit e os limites da mente humana levada ao extremo em uma situação desesperadora. O livro não passou despercebido e, com a produção de Ridley Scott e contando no elenco com atores como Jared Harris, Tobias Menzies e Ciarán Hinds chegou ao canal AMC este ano, sua a adaptação televisiva , trazendo para TV um terror sutil e envolvente por sua estranheza, que apresenta uma dezena de personagens e pontos de vista e que presta uma terrível homenagem a um dos maiores mistérios do século XIX, em uma das melhores coisas que assisti nesse primeiro semestre de 2018.

 
Jared Harris (esq) e o verdadeiro Krozier em foto de 1845 (dir)
A Série é protagonizada pelo capitão Franscis Krozier (Jared Harris), que amargurado por uma rejeição amorosa, parte para o ártico no comando do navio HMS Terror, sendo acompanhado de perto pelo navio HMS Erebus, de onde Sir John Franklin (Ciarán Hinds), tio e tutor da mulher que o desprezou, comanda a expedição mais ousada da marinha da rainha Vitória. No entanto, a pouca sorte na vida íntima se apresentará como o menor dos problemas do capitão Krozier, quando poucos meses após adentrar o ártico ambos os navios acabam presos no gelo, dando aos marinheiros a paciência pela espera do degelo como única alternativa, o que começa a se complicar quando uma equipe que procurava sinais de descongelamento longe dos navios acaba baleando por engano um misterioso xamã esquimó que atravessava o deserto de gelo junto com sua filha. A partir desse dia, uma maldição parece subir a bordo, com os marinheiros se vendo vítimas de envenenamento por chumbo, tendo seu estoque de comida destruído e sendo caçados por uma estranha criatura sobrenatural, que embora lembre um gigantesco urso polar, parece raciocinar e planejar dar cabo da tripulação. Todas essas situações vão insuflar o caos, o amotinamento e a total selvageria entre a tripulação, sobrando ao capitão Krozier e alguns de seus aliados, a tarefa de buscar sobreviver em meio ao pesadelo gelado onde ficarão presos por mais de três anos.

    Que série fantástica! Fugindo do convencional e transportando o expectador para uma trama que especula sobre um mistério de mais de 170 anos temperado com doses certas de suspense e sobrenatural, “O Terror” faz jus ao nome e apresenta uma história com momentos que flutuam entre a construção de tensão de um Stephen King e a loucura que a estranheza total, no melhor espirito Lovecraftiano, pode causar. 

   No tocante a construção da tensão e todo estranhamento que a série possui, a direção e produção se destacam por escolhas que parecem prender ainda mais quem assiste frente a TV. A vasta paisagem branca e gelada, quase sempre contendo apenas o som do vento como complemento, quando não uma música com notas destoantes que consegue transmitir ares de solidão ao mesmo tempo em que se assemelha a um sonho, são tão essenciais na série quanto suas dezenas de personagens que, com destaque no que vemos ou apenas como pontas, nos indicam todas as facetas da situação.

  
Tobias Menzies (esq) e o verdadeiro FritzJames (dir) foto de 1845
Dentre esses personagens, vale a pena destacar alguns que, junto com o Capitão Krozier, Capitão Fritzjames e Sir John Franklin, marcam outros núcleos e encabeçam questões que vão movendo a trama. Dentre os de maior destaque temos o tímido assistente de cirurgião Henry Goodsir (Paul Ready), que em meio ao caos e barbárie que vai crescendo é uma das poucas pessoas que tenta fazer os companheiros ouvir a voz da razão, assim como é quem investiga as causas dos males de saúde que começam a aparecer entre os exploradores, sem dizer que é ele que contando apenas de paciência e empatia, vai buscar aprender a falar a língua dos esquimós para tentar encontrar respostas da misteriosa Lady Silence, a filha do Xamã que é morto por acidente. Essa, por sua vez nos conecta com a mitologia Inuit e o sobrenatural, nos entregando lentamente que por trás daquela sequência de problemas que os tripulantes dos navios vão enfrentando, há uma verdade que vai além da compreensão mundana.

    Mundano, talvez seja a palavra que melhor defina o vilão da trama. Cornelius Hickey (ou seja lá quem ele é realmente) não parece não possuir escrúpulos para sobreviver e é capaz de queimar seus próprios companheiros como combustível se isso significa sobreviver. Ele surge discreto e, tal qual a trama, vai crescendo e ganhando força ao liderar o motim que divide a tripulação e, seu cinismo e violência tomam tamanha proporção, que ao final dos dez capítulos fica difícil de saber se o verdadeiro monstro a ser temido é o Tuunbaq (a criatura que persegue os marinheiros) ou o próprio marinheiro Hickey.

    
Ciarán Hinds (esqu) e Sir John Franklin (foto 1845)
Mas nem tudo é perfeito em “O Terror”. Por resumir um livro de mais de 700 páginas em uma série de dez episódios, muito do aprofundamento da relação dos personagens fica parecendo vago e parece que algo nos escapou. Um exemplo é a estranha relação entre o médico Dr. McDonald com um dos marinheiros do Erebus, que remete a um caso amoroso, mas que não fica bem claro. Do mesmo modo que não fica claro o exato momento que, já sem alimentos e tendo de abandonar os navios, o grupo que acompanha Cornelius Hickey aceita, sem discutir de forma mais ampla, consumir a carne dos companheiros mortos, ou a medida exata em que o Tuunbaq é racional e qual sua verdadeira relação com lady Silence. Mas ao final, até essas pontas soltas ajudam a tornar mais densa a sensação de mistério que a produção traz.

     
Presos no gelo
Mas apesar de seus problemas no aproveitamento total dos personagens e suas relações, “O terror” foi uma das melhores séries que assisti nesse inicio de ano. Sua produção é lindíssima e a sua trama fascinante, principalmente ao lembrar que parte dessa história terrível é real, com a descoberta de que problemas com a solda dos enlatados da expedição permitiram que a comida estragasse antes do tempo e que, com base na necropsia de três corpos da tripulação, encontrados enterrados na ilha canadense de Beechey , houve realmente um envenenamento por chumbo, além de os marinheiros sofrerem com o Escorbuto e a tuberculose; a tradição esquimó da região conta história de luta entre tripulantes e atos de canibalismo sendo que apenas em 2016 (quase dez anos depois do lançamento do livro) os restos dos navios foram encontrados no mar canadense, encerrando um mistério de mais de cento e setenta anos, mas não as circunstâncias e o que realmente aconteceu com a tripulação da expedição de John Franklin.

   Então se quiser algo diferente para assistir, que transite entre o real e o sobre natural, com uma produção caprichada e boas atuações, além de uma história que te prende; embarque no Terror e também se perca na imensidão gelada do desespero humano. Garanto que você não se arrependerá.




quarta-feira, 2 de maio de 2018

VINGADORES: GUERRA INFINITA (2018) ou, Thanos: O filme








  Em mil novecentos e noventa e nove, o marcante Agente Smith proferia em “Matrix” uma frase que ecoaria anos a fio na cultura pop, que “O ser humano é um vírus” que pula de região em região devastando e consumindo todos os recursos até que não sobre nada, sendo a única solução para que o sistema se equilibre a total extinção do vírus. Anos depois, em 2008, quis o destino irônico que Keanu Reeves (O antagonista de Smith em “Matrix”) interpretasse Klaatu em “O dia em que a terra parou” ,um Alienígena, que se dizendo amigo da Terra, vem dar um fim à raça humana antes que ela acabe com todas as outras formas de vida do planeta. Então, Eis que quase vinte anos depois do Agente Smith e dez de Klaatu, outro vilão surge para ampliar as ideias de seus predecessores em níveis galácticos ao afirmar que “há vida demais no universo” e isso deve ser contido. Trata-se do ecoterrorista mais casca grossa que já nasceu ou, Thanos, o Titan Louco, para os íntimos, que chegou aos cinemas nesse último dia vinte e seis de Abril para bater de frente com os “Heróis mais poderosos da terra” em um dos filmes mais esperados da década, trata-se de: “Thanos, O filme”, digo: “Gente de mais para duas horas e meia”, ou melhor, “Vingadores: Guerra Infinita”, filme dos irmãos Russo que (quase) fecha a “Trilogia” Vingadores.


  O Filme trás finalmente para as telonas, os plano de Thanos de reunir as joias do infinito e colocar em prática sua ideia de dar equilíbrio ao universo... aniquilando metade da vida existente nele! (É isso), junto disso, dá sequência aos acontecimentos que envolveram os vingadores (ou aos personagens que faziam parte desse grupo) após a “Era deUltron” e “guerra civil”, unindo em um único filme (quase) todos os super-heróis do universo cinematográfico Marvel.

   Pois então, saí de casa com a expectativa lá em cima, havia assistido à “Pantera Negra” um mês atrás, fato que renovou minha fé nos filmes baseados em quadrinhos, estava levando meu filho de quatro anos pela primeira vez ao cinema e veria Thanos em ação de verdade depois de quase seis anos. Mas ao final das quase três horas , salvo muitas cenas divertidas de ação e do apelo visual que o filme tem, saí com a irônica sensação de que, justamente na história onde o maior vilão da Marvel tem por objetivo encontrar o equilíbrio para o universo, a história que me foi apresentada não estava perfeitamente calibrada.

   Quem sou eu para contestar os planos do Thanos do filme! Eu trabalho com contabilidade, estoques e compras, e, já fiquei parado na fila “expressa” do Supermercado esperando a caixa trocar o rolo de papel da máquina registradora mais de uma vez, ou seja, também acredito que se metade das pessoas não existisse, o universo entraria em equilíbrio, mas eu não sou ninguém... Thanos, ao contrário de mim, é um alienígena com centena de anos e uma das criaturas mais poderosas do Universo Marvel, que têm (ou deveria ter) objetivos e questões que vão além da compreensão e sentimentos humanos, então apresentar o cara como um ecoterrorista que se acredita iluminado pela certeza de que o universo, com a quantidade de vida que possui, irá ruir e para gerar o equilíbrio necessário precisa mandar 50% das formas de vida para a terra dos pés juntos, mas mesmo assim tem espaço em seu coraçãozinho para o amor, me parece uma ideia não tão bem executada de tornar o vilão compreensível e carismático. Thanos, para funcionar, deveria parecer caótico para nós e plenamente crível e competente para si e quem o conhece melhor, uma mistura de inteligência indiferente, força destruidora mas controlada e imponência, mas embora eu perceba isso, também não sei como faria isso em um filme PG13, mas como já falei, eu sou um ninguém, não um estúdio bilionário.

  
O protagonista
Essa ideia de dar destaque ao vilão, para, entre outras coisas, marca-lo na história do estúdio, assim como a concorrente fez com o Coringa de “Batman: Cavaleiro das trevas” tirou o foco dos quase trinta heróis que aparecem em cena, reduzindo quem dá nome ao filme a meros coadjuvantes de luxo, com quase nenhum aprofundamento e isso me incomodou bastante. Mas mesmo com essa predileção do roteiro pelo vilão, o filme está longe de tropeçar e encontra espaço para que alguns dos personagens mais queridos da gurizada brilhem quando se torna preciso, como o caso do Homem-Aranha, que trás , assim como em “guerra civil”, aquele espirito moleque para trama, o que além de empolgar com sua presença em cena, faz com que nos preocupemos com qualquer coisa que possa vir a acontecer com o jovem Peter Parker; Outro que se destaca também é Dr. Estranho, principalmente na épica batalha em Titan, com o feiticeiro supremo, mostrando que desde seu filme solo andou elevando seu nível para fazer jus a seu título e deixando em aberto um possível plano para o próximo filme.

  
"Uma mistura de anjo com pirata"
Quanto a experiência que o longa me trouxe, longe de mim dizer que o filme é ruim, pelo contrário, o fato é que só não achei ele tão bom como outros que o estúdio já apresentou, como “Pantera Negra” e “Capitão América: Soldado Invernal” , talvez porque nessa nova história a Marvel pareça regredir novamente ao filme cheio de piadas e ação não expondo aquele sentimento heroico que estes outros dois filmes expuseram tão bem, ou talvez por se tratar de um filme para apresentar uma situação que será resolvida só depois (no exato 03.05.2019) em Vingadores 4. No entanto, sua ação constante, com cenas de batalhas épicas que se realizam no campo e na cidade, na Europa, África e América, na Terra ou Titan, prendem a atenção de qualquer um que vai ao cinema ver a pancada correr solta entre super-heróis x Alienígenas, sem dizer que os efeitos especiais conseguiram hipnotizar meu filho e deixa-lo com um sorrisinho no rosto, embora ele tenha cochilado um pouco quando o vilão começou a falar e a falar.

     Mas apesar de algumas escolhas de roteiro que não me agradaram por completo, como a tentativa de mudar o status do vilão para o de anti-herói, o pouco tempo para respirar e dar profundidade aos personagens em meio a tanta ação e a Scarlett Johansson loira e não ruiva, o filme entrega o que promete, principalmente quando o entendemos como uma ponte, feita para nos levar até, ao que parece ser, um final marcante dessa geração de dez anos de Universo compartilhado Marvel.  No entanto, vale a lembrança dos filmes que citei no inicio do texto e que tinham em comum além da ideia de que se livrar de uma quantidade de gente pode ser um benefício ao mundo ou universo, o apelo ao carisma do vilão como sustentação da história, o que acabou não funcionando em “O dia que a terra parou”, que é uma refilmagem de um filme clássico de 1951 e que não acançou o sucesso pretendido e as sequências de “Matrix”, que se perderam em si mesmas ao dar o peso maior que o necessário ao antagonista. Obviamente  Thanos e todo universo MARVEL estão anos luz em popularidade e qualidade que o pretensioso filme de Klaatu e comparando com "Matrix", todo o planejamento da franquia de 10 anos do estúdio Marvel deixa a história das Irmãs Wachowski no chinelo e certamente esse filme arrecadará uns dois bilhões de dólares, mas mesmo com toda empolgação e publicidade, sempre há o perigo de um tropeço justo na hora da cereja do bolo. Mas Fica agora a torcida para que a sequência de “Guerra Infinita” corrija as pequeníssimas falhas da história de 2018 e dê o protagonismo a quem da nome ao filme, antes que o grande final de uma história de dez anos, acabe virando pó.