quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

IMPULSE - A série (2018)





  A frase mais repetida que eu ouço, quando falo de uma série, é: “tem na Netflix?”. Eu entendo esse questionamento, o serviço de streaming mais popular do planeta se transformou em sinônimo de relevância no que se trata de entretenimento e sendo assim, se tem lá, é porque é bom! Só que, existe muita coisa bacana sendo feita fora dessa bolha e que quase ninguém dá a devida atenção, mas que precisam conhecer.

  
Um bom exemplo é uma série de ficção científica que teve sua primeira temporada apresentada em 2018 pelo Youtube Premium, mas que por aqui pouco se falou. Trata-se de “IMPULSE”, produção baseada no livro homônimo de Steven Gould (que também inspirou o filme “Jumper” de 2008) e que conta a história de Enrietta “Henry” Coles, uma adolescente problema que após sofrer abuso, descobre que pode se tele transportar. 

   Comecei a assistir a série por pura curiosidade, mas ela acabou me tele transportando (pá-bum-tss) para dentro do mundo que os criadores entregam, conseguindo com sua história me fazer resistir de fugir de uma produção de dez episódios de 50 minutos em pleno calor de janeiro. No meio dessa batalha entre calor e curiosidade, posso dizer que oque mais gostei da produção é que ela coloca o “poder” da protagonista em segundo plano, ele é importante e sua descoberta dá movimento a toda trama, mas a história não fica batendo nessa questão a todo tempo, substituindo os clichês habituais de histórias de superpoderes por uma trama apoiada nas escolhas dos personagens e suas capacidades de lidar com as mesmas.

  
A Opção por deixar o fantástico meio que de lado, proporciona o aprofundamento dos personagens centrais, dando dramaticidade á uma série que tem uma premissa aparentemente rasa. A situação que dá origem a tudo é o abuso sexual sofrido pela protagonista e que, além de despertar seus poderes, causa a paraplegia de seu agressor. Tal situação além de liga-los profundamente durante toda a temporada, abordando sobre o limite do que é abuso, a consciência dos atos de cada um e a responsabilidade sobre o que se fala, ainda gera sub tramas bem interessantes envolvendo a família do agressor, da protagonista e até da polícia local, sem falar de uma misteriosa organização que se mantem quase que totalmente nas sombras até o final da temporada, mas que sinaliza ser tanto uma resposta sobre o passado, quanto a grande ameaça no futuro da protagonista.

    Outra coisa que gostei é que a série consegue dar tridimensionalidade aos coadjuvantes, fazendo com que entendamos suas razões e dúvidas e que nos importemos com eles. Dois exemplos são o irmão mais velho do agressor de Henry e a filha do padrasto da protagonista, que apresentam um desenvolvimento paralelo muito bem construído e que acabam a temporada totalmente diferentes de como começaram, o primeiro passando de um quase capanga do próprio pai e de postura violenta, para alguém que busca redenção pelos crimes e erros que cometeu para orgulhar o pai que o vem subestimando; enquanto a segunda larga a ideia de buscar a aprovação dos colegas de escola e, além de se tornar a verdadeira heroína da série, defendendo sua família,  se encontra como pessoa com a pitada de rebeldia que a irmã postiça lhe transmite.

Mas a série tem algumas questões que me incomodaram. A Maior é que ela começa apresentando um personagem, que possui o mesmo dom da protagonista, e que dá pistas dessa organização secreta que citei acima e da existência de outros como eles, mas a história parece utiliza-lo só para mostrar como essa organização é maligna e desiste dele o retirado da trama de maneira abrupta e chocante, com uma explicação fraca e sem cita-lo mais tarde. Outro problema é a própria protagonista que é extremamente grosseira e indiferente com os outros, jogando a culpa de tudo nas pessoas que a rodeiam e que parece não se preocupar com ninguém além de si mesma, seu crescimento como personagem oscila muito e a temporada termina sem realmente sabermos se ela aprendeu alguma coisa com tudo que aconteceu e, falo com tranquilidade, que se não fossem as tramas paralelas e os coadjuvantes bem construídos e a serie fosse totalmente focada em Henry Coles, não seria possível passar do quinto episódio.

    Mas embora possua alguns furos, “IMPULSE” é uma boa série. Consegue trabalhar razoavelmente bem a questão do abuso sem perder seu propósito de ficção científica, ainda trabalhando em paralelo com investigação policial e descobertas adolescentes, quase como um bolo onde se misturam muitos ingredientes e no final fica saboroso. A produção é muito bem feita, os diálogos são bem explorados e muitos deles cheios de tensão e, o clima e a ambientação gelada da série ainda colaboram para a ideia de solidão e desolação que a protagonista sente ao seu redor depois que, além de sofrer abuso, descobrir que não é uma pessoa como as outras.

  Então aproveite a minha dica e assista “IMPULSE” e se surpreenda com uma das diversas produções que NÃO estão no maior streaming do mundo, mas que mesmo assim, possuem grande qualidades e merecem ser notadas.