AS CAÇA-FANTASMAS o trailer mais odiado (ou como deixar de ser um babaca preconceituoso)
Dia três de Março desse ano, foi lançado mundialmente o primeiro
trailer do filme "Caça-fantasmas", que tem a direção e
roteiro de Paul Feig. O filme, reboot do clássico da sessão da
tarde, teve uma aceitação negativa desde que o estúdio anunciou
que nessa nova versão os protagonistas seriam mulheres e essa onda
de rejeição se concretizou no final do mês de abril, quando foi
divulgado que o trailer do filme ,que estreia dia quinze de Julho ,
conquistou o amargo título de trailer mais odiado do Youtube, com
mais de quinhentas mil negativações.
Não vou mentir. Quando anunciaram que no lugar dos personagens
clássicos o filme teria um grupo de mulheres como protagonistas, eu
torci o nariz. Esperei muito tempo para uma continuação dos dois
filmes dos Caça-fantasmas que marcaram a minha infância e a
decisão de fazer um reboot com outros personagens me desagradou
porque colocaria uma pedra sobre a possibilidade dos antigos
personagens retornarem. Também não posso ser sínico em dizer que
não me senti contrariado pelo fato de serem mulheres nos papéis
principais e logo procurei argumentos dando exemplos de filmes ruins
com protagonistas femininos, como "Elektra" (filme de 2005)
e " À prova de morte" (2007, o filme que menos gosto do
Tarantino) para justificar o que até aquele momento eu não
identificava como puro preconceito.
Mas depois de um certo tempo pensando sobre o assunto eu percebi como
eu estava sendo babaca. Na ânsia de encontrar no cinema um filme que
me fizesse ter uma experiência semelhante a que tive ao assistir os
anteriores mais de vinte anos atrás, ignorei duas questões de
extrema importância nos dias de hoje: a empatia e a
representatividade.
Era o máximo da representatividade dos anos 80
Sobre empatia, comecei a me imaginar qual seria a reação das
mulheres de hoje se o filme tivesse a mesma pegada dos filmes
originais dos anos oitenta. Nos dois filmes anteriores, temos apenas
duas personagens femininas relevantes, a primeira (interpretada por
Sigourney Weaver) é o interesse romântico do Dr Peter Venkman (Bill
Murray) e praticamente é a mocinha em perigo que serve para dar rumo
a trama, embora seja independente e uma musicista profissional, ela
transmite uma certa insegurança e trabalha com sua sensualidade na
maior parte do filme (após ser possuída) sendo sua presença
voltada exclusivamente para ser um objeto à ser alcançado pelo
personagem masculino e isso fica claro no segundo filme, quando a
personagem explica que terminou o relacionamento com o Dr Venkman
após este começar a apresenta-la nas festas como sua "escrava
sexual". A outra personagem feminina era a telefonista Janine,
que aparecia com todo esteriótipo possível da secretária, lixando
as unhas, chateada com o emprego e ainda dando em cima do patrão
Egon Spengler (Harold Ramis). Me coloquei no lugar das mulheres ao
assistir um filme desses sem a desculpa do Zeitgeist da época e me
senti incomodado, percebi então que só poderia haver uma maneira de
uma franquia que teve essas marcas (discretas mas reais) funcionar
nos dias de hoje e que seria focando na diversidade e
representatividade.
A representatividade é uma questão importante com a qual tive o
primeiro contato justamente nos filmes dos Caça-fantasmas. Eu, uma
criança negra dos anos oitenta, não era acostumado a ver negros em
papeis de protagonismo em nada que fosse positivo na TV ou cinema e,
foi assistindo o filme original da franquia, que me deparei com o
personagem Winston, um negro que chega para pedir emprego nos
caça-fantasmas e se torna parte do grupo; a entrada dele no grupo é
meio idiota, mas tenho de dizer que quando vi um homem negro que não
era figurante e sim parte dos heróis em um filme tão legal como
aquele, me senti mais conectado ainda a história. Então, como eu
poderia odiar um filme, que traria uma experiência parecida para
milhões de pessoas, mesmo que eu não esteja incluído nesse grupo?
Quem você vai chamar?
Penso que as pessoas que negativaram o filme tem muito medo, pois
foram acostumadas a ser hiper representadas e a possibilidade mínima
de apresentar outro tipo de pessoa e visão de mundo que não se
assemelhe a delas faz com que imaginem que serão colocadas de lado,
o que é um absurdo. É só pegar os grandes produções para vermos
que em sua grande maioria, os protagonistas são homens brancos, sem
problemas financeiros, de idade entre trinta e cinquenta anos e onde
a mulher é apenas o motivo para que a trama ande (como em caça
fantasmas 1 de 1984) e o negro é apenas o amigo fiel (gay então nem
pensar em um filme desses). Mas os tempos estão mudando e não
existe mais motivo ( e nunca houve) para prender a pessoa que é
diferente à um exteriótipo ou papel secundário, por isso acredito
de verdade que o filme DAS Caça-Fantasmas possa ser um divisor de
águas na história do cinema, mesmo que seja ruim (mas espero que
seja ótimo) porque se somará à "Star Wars VII" e "Mad
Max: estrada da fúria" trazendo luz novamente o fato de que
qualquer pessoa, seja homem branco ou negro, mulher hétero ou
homossexual, de participar de algo colocando o fato de ser um ser
humano, à frete de ser um clichê do cinema e antes de tudo
apresentando a diversidade as novas gerações.
Por tudo isso deixo aqui a minha promessa de assistir AS
Caça-fantasmas no cinema e ser um dos primeiros a escrever sobre ele
não poupando elogios caso o filme seja bom ou criticas caso não
seja, focando na história, direção, roteiro e atuações e não no
preconceito e medo que infelizmente é inerente a nossa sociedade.
Me despeço pedindo a todos mais tolerância e empatia. Lembrem que
são as nossas diferenças que fazem que nos completemos com os outros
e não nossas igualdades que são apenas ecos , muitas vezes, sem
graça de nós mesmos.
Não é errado ser babaca as vezes, errado é não querer mudar.
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