Já
dizia Marco Aurélio: “É melhor ser reto do que retificado”, e quem pode
discordar do imperador e filósofo romano? Até porque, fazer o mea culpa e
tentar recomeçar, ainda mais em tempos como os em que vivemos, onde um tropeço
é o suficiente para uma enxurrada de críticas ou o total desprezo, não é nada
fácil. Mas nem todos têm uma educação estoica como o nobre romano, não indo longe
da mediocridade humana e nessa, penso que o oportuno refrão da música
“Velocidade da luz” do grupo Revelação, onde se diz “... todo mundo erra
sempre, todo mundo vai errar!” fale mais alto do que qualquer frase solta de
velhas filosofias.
Foi
com esse pequeno texto em mente, repetido a exaustão como um mantra, que entrei
quinta (16/11) na sala de cinema para assistir a “LIGA DA JUSTIÇA”, o quinto
filme do universo compartilhado da DC / Warner (terceiro dirigido por Zack
Snyder) que, depois dos fracassos de crítica de “B x S” e “Esquadrão Suicida”
chegou aos cinemas dia 15 de Novembro com a obrigação moral de, junto do
sucesso de “Mulher-Maravilha”, redimir todo o projeto da DC e deixar claro aos
fãs que, persistir em erros não é algo digno do sangue das amazonas, dos filhos
de Krypton ou de cavaleiros das trevas.
O
filme segue os acontecimentos explorados em “Batman vs Superman”. Depois da
morte do homem de aço, Bruce Wayne, contando com a ajuda de Diana Prince, vai
atrás dos indivíduos com habilidades especiais descobertos por Lex Luthor para
ajuda-los a deter a invasão com a qual teve uma visão no filme anterior. No entanto, enquanto o cavaleiro das trevas
recruta com dificuldades Aquaman, Cyborg e Flash (esse nem tanto) para o seu
time, um mal ancestral, invocado pelas caixas maternas (três relíquia
alienígenas de posse dos Atlantes, Amazonas e humanos), desperta para
conquistar a terra (UuuuuUU), devendo essa nova aliança a árdua missão de impedir
o mal que cobiça o nosso mundo.
Não
sei se foi o meu mantra, as refilmagens feitas por Joss Whedon ou simplesmente
a ausência dos filtros sombrios de Zack Snyder, mas saí da sala de cinema bem
mais satisfeito do que eu imaginava que sairia.
Pela segunda vez (dentro desse novo universo) a Warner conseguiu trazer
um filme descente envolvendo os personagens da DC comics. O filme tem
problemas? Sim, tem e falaremos deles mais abaixo, mas os mesmos conseguem ser
diluídos naturalmente em meio a uma trama que foca mais em divertir do que
tentar mostrar toda a amargura que repousa no coração dos heróis, como os
filmes anteriores dirigidos por Snyder.
Para
começar, gostei bastante da pegada mais cômica dessa produção, principalmente
das cenas protagonizadas pelo Flash, que é interpretado por Ezra Miller (nunca
critiquei) que, apesar de utilizar o nome do mais famoso flash (Barry Allen),
trás uma versão do personagem para o cinema bem diferente da vista na série da
CW, ao apresentar um mix dos “flashes” mais icônicos das HQ’s. No filme, Barry
Allen, em uma versão bem mais jovem do que antes vista, lembra muito mais o
leve e engraçado Wally West, sobrinho de Allen nos quadrinhos e que foi o flash
depois da Crise nas infinitas terras (onde Barry morreu) ou até mesmo Bart
Allen, o atrapalhado neto de Barry, que vem do futuro para aprender a usar seus
poderes e que fez sucesso ao integrar a Justiça jovem junto com o terceiro
Robin e o segundo Superboy nos anos noventa, do que o sério Barry Allen que eu
acompanhava nos gibis publicados em formatinho nos anos oitenta aqui no Brasil.
E é através dessa versão do Flash que somos apresentados ao novo ponto de vista
do projeto da DC nos cinemas, muito mais colorido e menos amargurado, onde
apesar do trauma inicial (teve a mãe assassinada quando era criança) o jovem
herói ainda consegue se maravilhar com o mundo novo que se mostra a ele após
conhecer Bruce Wayne (vide cena na Bat-caverna) e ter esperança na justiça, ao
não desistir do pai que é acusado de assassinar sua mãe e que ele sabe que é
inocente, assim como se arriscar para salvar outras pessoas, em meio a uma
invasão alienígena, mesmo nunca tendo participado de uma batalha de verdade.
Outro
ponto bacana do filme é o retorno do Superman (spoiler) e a nova personalidade
que deram para o maior herói das HQ’s da DC. Depois de dois filmes mostrando um
Clark Kent que beirava o egoísmo, para não dizer que o abraçava por completo,
onde o mesmo, ou estava mais interessado em bater em Kryptonianos que olhavam
torto para sua mãe ou para ele em “O homem de aço”, não se importando em
destruir Smallville e Metrópolis no caminho, ou proteger quase exclusivamente
seu interesse romântico, a onipresente Lois Lane em “B vs S”, agora ele
finalmente lembra aquele “farol ético” que é capaz de conduzir a humanidade ou se
sacrificar por ela sem pensar duas
vezes. Isso fica bem claro na sequência de batalha onde, após ouvir os apelos
de pessoas que se encontram ao redor do lugar ameaçado, ele deixa seus novos
super-amigos com a missão de vencer o grande vilão e parte para o resgate nos
presenteando com uma sequência que é a cara daquele homem de aço das HQ’s,
sendo tão heroica quanto cômica.
Sobre
a Mulher-Maravilha há muito pouco para se falar, a não ser que ela continua tão
maravilhosa quanto nos outros filmes onde apareceu para iluminar, ficando claro
que, se o universo DC parece começar a funcionar, ela é a principal
responsável. Vale também uma menção honrosa ao esforço que a produção fez e o
sucesso que obteve ao dar carisma e relevância a alguém como o Aquaman, pois ,
com certeza, não é fácil colocar um personagem cujo poder mais famoso, depois
de respirar em baixo da água, era falar com peixes, no nível de
Mulher-Maravilha e Batman e, mesmo esse fato virando uma piada que é repetida
duas vezes dentro do filme, suas cenas de batalha e presença, somados à alguns
momentos de comédia (como quando eles estão indo para a batalha final e ele
senta sobre o laço da verdade) fazem com que realmente nos importemos com o
herói, fato que também serve para o Cyborg, que mesmo tendo menos carisma,
surge na trama como chave para entender e “desligar” as caixas maternas, além
de ter uma crescente sintonia com o Flash que pode ser a semente de uma
parceria bem bacana no futuro.
No
entanto, como eu disse acima, o filme também tem seus problemas e nenhum é,
para mim, maior do que o Batman. Nas HQ’s, Bruce Wayne sempre teve sua
inteligência, foco e força de vontade (além da habilidade física) como seu
verdadeiro super poder (e não a riqueza) e estes eram controlados por uma
seriedade que conseguia inspirar o respeito de todos, já em “Liga da Justiça”,
apesar de não nos depararmos com um Batman assassino e descontrolado como o de
“B vs S” novamente não temos a presença DO Homem-Morcego. Desta vez o que
encontramos é um alívio cômico que serve de escada para toda sorte de piadas
(quando elas não surgem dele mesmo), gaguejando e fazendo cara de susto a todo
o momento e que, além de parecer fugir da liderança da equipe, repassando isso,
uma hora para a Mulher-Maravilha e outra para o Super man, termina quase como o
expectador da batalha final ao se encarregar dos vilões coadjuvantes (os
para-demônios), não parecendo nem de longe, aquele super detetive, ninja, gênio
e Bilionário dos gibis e sim um “Gavião-Arqueiro” de Luxo ou o Dedé dos
trapalhões.
Outra
coisa que não curti muito (Além das centenas de câmeras lentas durante o filme),
foi a cena de batalha que é mostrada quando é explicado o que são as caixas
maternas. Além de a explicação parecer uma história inventada na hora pela
Mulher-Maravilha baseada em “O senhor dos anéis”, pois fala da união dos povos
diferentes (trocando Elfos / Anões/ Humanos por Atlantes / Amazonas / Humanos) para
destruir uma relíquia que dá poder a um inimigo e pode por um fim em tudo, a cena
que se desenrola é muito artificial, com um CGI bem Playstation 4 e que mostra
um monte de personagens que quase não dá para saber quem são, mal se
identificando um Lanterna verde ali no meio (e que morre miseravelmente) e
acaba sem dar as respostas que parecia prometer, deixando apenas a dúvida de
quem eram aquelas pessoas com poderes e para onde foi o anel do lanterna morto.
Apesar
dos pequenos problemas, “LIGA DA JUSTIÇA” é um bom e divertido filme, que
consegue dar novos ares ao projeto da DC nos cinemas e exorcizar (até certo
ponto) os erros de filmes como “O homem de Aço” e “Batman vs Superman”, em uma
demonstração de que ser retificado, principalmente por Joss Whedon, é melhor do
eu seguir sendo reto por Zack Snyder. Fica agora a missão da Warner de
conseguir fazer o mesmo nos filmes de heróis menos conhecidos ou icônicos como
o Cyborg, assim como retirar toda a carga caricata criada em personagens como
Lex Luthor e Coringa, que tiveram aparições desastrosas em filmes anteriores do
selo, mas isso é um problema para o futuro, por hora eu digo, dê uma chance a
DC e assista “Liga da Justiça” e se não concordar com tudo que eu disse acima,
me perdoe, porque “Todo mundo erra sempre, todo mundo vai errar” uma vez ou
outra, mas as vezes acerta ... Snyder que o diga!