A vida é uma guerra onde, ano após ano,
vamos sendo expostos a todo tipo de atrocidades e frustrações. É nela onde criamos
laços com outros como nós, mas logo nos habituamos a perdê-los e, se temos
sorte, chegamos ao final da última batalha com boas histórias, alguns
arrependimentos e muita saudade. Mas, e se aos setenta e cinco anos, tivéssemos
uma nova chance de começar do zero, nos atirando as cegas em uma viagem sem
volta, onde a única certeza é uma nova vida com muito mais aventura e violência,
você toparia?
O “E
porque não?!” para essa questão, é o que dá início a trama de “guerra do Velho”, livro do escritor John
Scalzi, publicado no Brasil pela editora Aleph e que, como uma rajada de MU-35,
chegou para quebra meu hiato para falar sobre o que eu mais gosto: ficção
científica.
O livro conta a história de um futuro onde
a raça humana chegou à era das viagens interestelares e passou a colonizar
diversos planetas, tendo contato com outras civilizações, das quais muitas
hostis. É nesse universo que conhecemos John Perry, um publicitário aposentado
e viúvo de 75 anos, que se alista nas forças coloniais de defesa (FCD) e parte
para o espaço em uma viagem sem retorno para defender nossas colônias, sem
imaginar quantos terrores e maravilhas presenciaria após sua última decisão no
planeta Terra.
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Edição da Apleph |
Gostei bastante do livro, mas tenho que
confessar que minha primeira impressão da história foi negativa e se estendeu
assim quase até a metade da trama. Algumas das coisas me desagradaram foram, as
muitas semelhanças com “Tropas Estelares” de Robert A. Heinlein e a mentalidade
extremamente aberta e “pra frentex” de senhoras e senhores de 75 anos, mas
superei a primeira ao focar mais nas diferenças entre as histórias dos autores do
que suas semelhanças e a segunda me colocando no exato lugar do protagonista e
seu grupo de amigos, que receberam ao final da vida uma nova chance de se
aventurar e conhecer coisas novas, em uma situação como esta, se apegar a
preconceitos e costumes do passado, não melhoraria a vida nova de ninguém.
Mas a coisa que mais me desagradou, foi o
fato de que tudo acontecia de maneira extremamente perfeita para o
protagonista; ele é o cara mais simpático e agradável do mundo e que acaba se
cercando dos velhinhos mais bacanas, inteligentes e descolados já na viagem até
a nave que os levará ao lugar de seu treinamento; após as melhorias nos corpos
dos recrutas (das quais falaremos adiante) é ele quem pega a recruta mais
gostosona, é ele quem vira o queridinho do sargento que os treina e que, por
isso, é eleito líder de pelotão, é ele quem, em sua primeira batalha, descobre
como vencer os inimigos mais perigosos das FCD, é tudo muito perfeito... Aí eu
me toquei que o livro é narrado em primeira pessoa e que o protagonista é
publicitário, ou seja, ele estava colocando um pouco de “tempero” em si mesmo
para se vender como o maior herói que já existiu, em um detalhe tão sutil e
brilhante de Scalzi, que mudou minha percepção da história após eu nota-lo.
Mas fora esses desagrados iniciais com o livro,
“Guerra do Velho” apresenta conceitos muito bacanas e sua história vai
crescendo em uma medida tão acertada, que se torna bem difícil para um fã de
ficção científica se decepcionar com o que o autor apresentou ao final das
trezentos e sessenta páginas. Para começar temos toda a ideia de tecnologia das
FCD, começando com a resposta para, como alguém consegue lutar em uma guerra,
após os 75 anos de idade? Pois bem, no universo do livro, a raça humana teve
contato com outras raças a quase um século e com isso, acesso a muitas
tecnologias que se tornaram segredos das colônias, uma dessas tecnologias, é a
transferência de consciência e é isso que possibilita a ida dos recrutas à
guerra. Na história, quando se chega aos
65 anos de idade, a pessoa decide se quer fazer parte das FCD dez anos mais
tarde e nisso, vários testes são realizados e amostra de sangue e pele retirados,
o que os futuros soldados desconhecem (pois nenhum cidadão da terra sabe nada
do que ocorre nas colônias) é que um novo corpo, repleto de alterações e
melhorias, vai sendo maturado e deixado a sua espera, para quando este resolver de uma vez sair de seu planeta natal.
E o corpo é incrível! Com olhos de Gato para enxergar melhor na penumbra, com
corpo na melhor forma atlética possível, com sangue que transporta mais
oxigênio e coagula mais rápido para evitar hemorragia, um computador e
assistente pessoal instalado no cérebro e uma pele verde rica em clorofila para
ajudar a obtenção de energia.
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Scalzi |
Mas o que mais me agradou foram os conceitos
referentes aos alienígenas que as FCD vão de encontro para garantir a segurança
dos colonos Terráqueos no universo. Os primeiros a aparecer em batalha e
grandes rivais misteriosos da humanidade, são os aliens conhecidos como
“Consus”, uma raça extremamente avançada e detentora de tecnologias
infinitamente a frente das que aparecem no livro, mas que se limita a ir a
campo de batalha com as armas no mesmo nível dos rivais que encontram. Sua
aparência é descrita como semelhante a de um inseto meio humano, com quatro
braços, sendo que os de cima são duas lâminas extremamente afiadas que eles
também utilizam como arma e suas entradas nos planetas são sempre realizadas
com rituais e cerimônias, tornando as intensões e razões desses inimigos
misteriosas. Também temos os Covandus, seres humanoides de algumas polegadas,
que conseguem um relativo sucesso contra a raça humana utilizando sua força
aérea em miniatura, ou o misterioso fungo da colônia 622, uma entidade coletiva
inteligente que dominava o planeta e que esperou o momento oportuno de atacar e
matar todos os colonos adentrando pelas vias aéreas dos coitados e excretando
ácido em seus pulmões, fato que faz com que a raça humana desista do planeta em
questão, ou ainda os antropófagos Rraeys, criaturas de características que
lembram aves e que enxergam na raça humana uma iguaria sem igual; são estes
últimos os responsáveis pelo massacre do planeta Coral, o ponto de virada do
livro e que dá início a uma sequência de batalhas e lutas que alavancam a trama
com muita ação.
Pois bem, Eu poderia escrever parágrafos e
mais parágrafos sobre o livro, citando a relação do protagonista com seus
amigos, seu crescimento dentro das FCD, explorando a possível ditadura e, quem
sabe, distopia por de trás do governo colonial, ou simplesmente falando sobre
as “Brigadas Fantasmas” o time de elite das FCD, mas como na maioria dos livros
que resenho, não fiz questão de me aprofundar para que quem conhecer por aqui e
se interessar pela obra, não tenha suas expectativas totalmente estragadas por
esse texto. Deixo aqui só a certeza de que "Guerra do velho” é um livro
divertido e que apresenta um universo extremamente interessante e para quem,
assim como eu, se incomodar com um protagonista que não erra, digo para ter
paciência; para quem enxergar semelhanças com outras obras, calma, há muito mais
originalidade do que homenagens. Faça então como os recrutas da FCD e deixe de
ser velho leia a obra de John Scalzi e mergulhe em uma viagem sem volta repleta
de aventura, ação e violência, tal qual as batalhas da vida, mas com garantia
de muito mais diversão do que frustrações.
Bah!! Quero ler..parece ser muito legal
ResponderExcluirE um livro muito bacana.. tem seus problemas, como eu falo acima... mas, principalmente do meio para o fim, dá um salto em ritmo e diversão que prende o leitor e planta a semente para comprar a sequência "Brigadas fantasma"
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