Voltei a ler quadrinhos. Há
bastante tempo que não fazia isso direto e não queria começar com
as edições mensais já de saída, então resolvi pegar alguns que
fugissem um pouco do padrão e do estilo já estabelecido e tendo
isso como guia, resolvi por matar a curiosidade de ler algo do Garth
Ennis que não fosse o aclamado "Preacher" (que já
aproveito para dizer que não sou o maior fã), assim escolhi "A
Pro", roteirizado por Ennis e desenhado pela Excelente Amanda
Conner. E não é que o bendito roteirista me surpreendeu! Enquanto
meu filho e enteada assistiam à "cúmplices de um resgate"
tive um divertido final de tarde dando muita risada da zoação ácida
que Ennis faz com os super-heróis.
A HQ conta a história de Pro,
uma prostituta de rua, especializada em gato-bola, que tem um filho
recém nascido e vive na merda. Ela é observada por um alienígena
que se intitula de "O inspetor", o qual aposta com seu fiel
robô assistente, que qualquer pessoa tem as qualidades para se
tornar um herói e assim lhe concede poderes e a indica para a "liga
da Honra" para os ajudar a combater o crime, no entanto, sua
personalidade, boca suja e visão do mundo real vão se apresentando
como os maiores desafios tanto para seus novos companheiros, quanto
para ela.
O que mais gostei em "A
pro" é o fato de ser uma história ágil, não tem aquele lenga
lenga desnecessário para te fazer comprar dez edições, além
disso, a história é muito engraçada e suja, a personagem realmente
transmite aquele olhar de sarcasmos e desesperança de alguém que
veio da pior merda possível e tudo que ganhar é lucro. A
protagonista é sempre mostrada como estivesse de saco cheio, com
cara de cansaço, fumando e nos poucos momentos em que ela parece
estar relaxando é quando está sentada no vaso e grande parte desse
efeito transmitido se deve aos desenhos de Amanda Conner, que
consegue apresentar em um tom cartunesco, um mundo que tem a presença
de super-heróis (mesmo que toscos) mas que as misérias e a dureza
estão expostas como ,no caso, na vida de merda de uma prostituta de
rua.
A liga da honra merece um
parágrafo. Garth Ennis, que odeia trabalhar com super-heróis (e
isso fica claro quando lemos outros de seus trabalhos, em destaque
"The Boys"), não tem a menor vontade de esconder que
aquela ali é a liga da justiça da DC, ali encontramos o Santo, que
é a versão do Super-man, mas que trás até no seu alter ego a
timidez e inocência de um Clark Kent da era de ouro; temos o
cavaleiro e seu fiel ajudante o escudeiro, versão de Batman e Robin,
onde o escudeiro é sempre retratado ou agarrado as pernas de seu
mentor ou sendo encochado por ele, dando forte referência a
homo sexualidade da dupla; a Dama, que seria a mulher maravilha que se
revela com tendências lésbica; O veloz que seria o Flash trajando
apenas cuecas e um suspensório e o Lima como a versão do lanterna
verde John Stwart e falando feito um mano. Todos eles são retratados
tão cheios de si, tão focados apenas no seu mundo que cabe a
protagonista, como toda sua falta de sutiliza e sensibilidade
esfregar o quanto eles são uma piada e essa é uma das grandes
partes da HQ, quando a Pro começa a apontar os defeitos de cada um e
questionar para quê se precisariam de heróis que não são
eficientes, o humor negro impera e é muito bom.
Ainda sobre a "liga da
Honra", embora , aparentemente, a intenção do autor seja
realmente tirar sarro do ícone, que deveria ser um exemplo de
perfeição, mas que de perto se apresentam como um bando digno de
risos, quando buscamos fazer uma leitura mais profunda da história,
podemos relacionar esses ícones com nossos líderes , tanto
políticos como os sociais, tais como os chefes do trabalho ou
lideranças religiosas, que estão focados tanto em seu ponto de
vista em relação a sociedade e seus interesses, que por vezes não
conseguem enxergar como um igual quem os rodeia ou quem sofre com
suas decisões. Levando isso em consideração, o fato de "A
pro" ter uma origem e interesses bem diferentes da liga da honra
a expõem à desconfiança e subtrai sua credibilidade por parte de
seus colegas, o que faz com que ela apenas reafirme sua personalidade
e erros recorrentes de sua vida, até que uma decisão feita em um
momento crítico a faz se tornar a heroína que o Inspetor acreditava
que ela seria.
Achei a história bem bacana.
O enredo é simples, mas é original pelo atrevimento e sujeira
contido nele; Garth Ennis me surpreendeu, porque eu não conseguia
mais desvincula-lo ao roteiro de "Preacher" (que já falei
que não gosto muito e um dia eu explico porquê.) e do "the
Boys". O desenho é muito bem feito, chamando a atenção tanto
pelas formas caricatas como são apresentados os super-heróis,
quanto pelos detalhes sórdidos que podemos ver em segundo plano em
alguns quadros da história; as cores forma bem escolhidas para
transitar entre um universo de fantasia das HQ's e a sujeira da vida
real e a agilidade da história torna tudo divertido e leve (até ali
né). Uma história engraçada, crítica, ácida e suja, que eu deixo
aqui como dica, para quem gosta de quadrinhos de super-heróis e
principalmente para quem não gosta e quer dar boa risadas.
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