Os vilões sempre vencem! Essa frase, que
se lê como easter egg em alguns episódios da primeira temporada da série
“Mr.Robot”, foi a primeira coisa que passou na minha cabeça ao terminar um dos
melhores romances policiais que já li até os dias de hoje, isso depois de
desfazer o nó de minha garganta e contemplar o horizonte por alguns longos
minutos.
Estou falando do livro “ZULU” do escritor
francês Caryl Férey, publicado no Brasil pela editora Vestígio, que tive a
sorte de encontrar por acidente em uma prateleira de supermercado enquanto
esperava entediado para ser atendido pelo caixa e que me apresentou uma trama
tensa e pesada, com personagens carismáticos e tridimensionais, ambientada em
uma país dividido por feridas do passado e a dura realidade desigual do
presente que me prendeu com a garganta seca e o coração acelerado até a última
linha.
A primeira coisa que chamou minha atenção no
livro foi a forma primorosa como o autor consegue nos colocar dentro do
ambiente e das situações que vão se seguindo. Através de uma escrita ágil, mas
extremamente detalhista, Caryl Féry nos leva a uma África do sul sem maquiagem,
com as cicatrizes do apartheid à mostra e com todos seus problemas sociais
expostos, no meio de um caos que a história só faz crescer enquanto ao mesmo
tempo consegue abordar o que à de pior e de melhor nos seres humanos, em um
estilo que fica bem centralizado entre um George R.R. Martin e a profundidade
cinza de seus heróis / vilões e o charme e brutalidade dos detetives dos livros
de James Ellroy.
Esses
mesmos personagens que, para mim, quando bem escritos são o segredo da
qualidade de qualquer grande obra literária ou cinematográfica, são a segunda
coisa que me fisgou no livro. E a maneira como o autor dá um mínimo de
profundidade a todos eles, os apresentando em pequenos capítulos que dão uma
ideia geral de sua personalidade e seus motivos, quando não contando mesmo suas
biografias e o que aconteceu para que eles tivessem chegado até aquele momento
da história, facilita essa percepção de relevância de cada um deles. É assim
que conhecemos o terrível passado de Ali Neuman, sobrevivente dos últimos dias
de Apartheid e que presenciou o assassinato do próprio pai e do irmão mais
velho; Do mesmo modo descobrimos sobre as origens africânderes do rebelde
Tenente Epkeen, de seu desprezo pelo sistema e relação conturbada com o filho e
a ex-mulher, essa mesma tendo um grande destaque na última parte do livro; Ou
ainda nos emocionamos com a relação do policial Dan Fletcher com sua esposa com
câncer e o medo de deixar seus filhos desamparados; tudo isso em meio a outras
tantas histórias e personagens que compõem a trama. Férey descreve tão bem
esses personagens que mesmo antes de terminar a primeira parte do livro já
fomos pegos nessa armadilha que acabamos nos sentindo tão íntimos deles que
sentimos seus medos, nos entristecemos com suas frustrações e tememos por suas
seguranças a qualquer sinal de ameaça.
O Autor |
Mas mesmo terminando com um soco no
estômago, a ponto de colocar um nó na minha garganta e um amargo na boca por todos
os sacrifícios feitos pelos personagens (em especial ao final da primeira parte
e do último capítulo), a leitura de “Zulu” me proporcionou uma grande prazer.
Por seus personagens humanos e realistas, a Trama investigativa extremamente
inteligente e clima de reflexão social pertinente e assustadora (e que, em
alguns aspectos, lembra muito nosso país) indico a todos que desejarem uma
história cheia de reviravoltas e que estejam dispostos a ir até aos
esconderijos mais sombrios e sujos da mente humana, mas sempre com a verdade em
mente de que os vilões sempre vencem.