BRIGHT (2017) quando o senhor dos anéis encontra um dia de treinamento.
A grande maioria das histórias de fantasia
se passa em uma espécie de idade média, com seus castelos, espadas e campos de
batalha, mas como será que essas sociedades repletas de seres mágicos, como
elfos, duendes, dragões e orcs se encontraria mil, ou dois mil anos, depois das
histórias clássicas imaginadas por Tolkin, C.S Lewis ou Martin e se deparassem
com problemas como o preconceito, corrupção e desigualdade social? Pois a
resposta para essa pergunta é o pano de fundo da mais nova produção da Netflix,
“BRIGHT”, filme escrito por Max Landis, dirigido por David Ayer e estrelado Por
Will Smith e Joel Adgerton que estreou no último dia vinte e dois trazendo um
pouco mais de magia para os últimos dias de 2017.
O filme acompanha o policial humano Ward
(Will Smith) e seu parceiro e único policial Orc, Nic Jakoby (Joel Adgerton),
que estão voltando a trabalhar juntos após Ward ter sido baleado por um Orc
devido ao descuido do parceiro (mais ou menos), o que destruiu a pouca confiança
que havia entre os dois anteriormente. No primeiro dia de retorno as patrulhas
da dupla, eles acabam se deparando com uma guerra secreta entre um grupo
conspirador que quer ressuscitar um antigo líder Elfo renegado e extremistas
humanos que querem impedi-los e acabar com o poder dos Elfos no mundo; no meio
disso, surge uma misteriosa Elfa (Lucy Fry) de posse de uma varinha mágica, uma
relíquia capaz de realizar todos os desejos de quem a possui, o que atrairá a
cobiça das gangues de Orcs e humanos, dos elfos renegados, da força tarefa
mágica e da polícia corrupta, transformando o que era para ser uma noite de
patrulha rotineira em uma corrida pela sobrevivência não só da improvável
dupla, como do mundo como eles conhecem.
O filme traz o retorno de David Ayer para o
terreno que lhe deu destaque, abordando as dificuldades de convivência entre os
diferentes, a dualidade da polícia e o mundo do crime, tudo com o toque de
fantasia proporcionado pelo cérebro nerd de Max Landis e o resultado é um filme
que, apesar de seus problemas no aprofundamento do ambiente e contextualização
de alguns acontecimentos, é bem divertido.
Toda elegância de um Elfo
Entre as coisas boas que o filme tem, está a
apresentação de uma história fantástica para debater nossa realidade social, no
caso o racismo, que é referenciado através do preconceito sofrido pelo povo
Orc, que vive em guetos e é vítima de violência policial, lembrando em muito os
problemas vividos pelos alienígenas do filme “Distrito 9” de Neill Blomkamp,
mas em “Bright”, diferente do filme de 2009 do diretor Sul-africano, esse
preconceito não se deve ao egoísmo em dividir a terra com uma raça
extraterrestre, mas ao fato de que a dois mil anos atrás, os Orcs terem se
aliado ao “senhor das trevas” o líder renegado Elfo que citei acima e que
tentou dominar o mundo utilizando magia, o que gerou ressentimento nos humanos
e Elfos. E o peso de todo esse preconceito é duplamente sentido por Jakoby, que
é desprezado pelos humanos por ser um Orc e por sua própria raça por não ser
“de sangue” ( Não pertencer a nenhum clã) e ser policial; sendo que é através
de sua jornada, tentando se encontrar entre os interesses de seu trabalho como
policial e seu lugar na comunidade Orc, que trilhamos as ambiguidades do
universo criado por Landis até experimentarmos a catarse que dá todo sentido ao
filme em seu final, quando vemos o policial Orc reconhecido em ambas situações
(spoiler na cara!).
Outra coisa bacana é ver o estilo de David
Ayer de tiro, porrada e bomba, funcionando novamente depois do tenebroso “Esquadrãosuicida”. Mesmo com a aura fantástica, o filme não perde a tensão e ritmo de
thriller policial com a dupla protagonista vivendo uma verdadeira odisseia
através dos guetos de Los Angeles e proporcionando ao expectador grandes
momentos de tiroteios, perseguições de carro e até lutas marciais. Soma-se a
isso ainda o carisma de Will Smith, que apesar de protagonizar o filme, não
apaga a relevância de ninguém que divide a tela consigo e a trilha sonora, que
nesse filme de Ayer, é muito pontual e acertada.
Orcs de Gueto
Mas o filme tem seus problemas e, embora
nenhum o deixem menos divertido, expõem
pontas soltas que apontam falhas na
edição que começam a se tornar uma assinatura negativa do diretor. O maior
exemplo desses erros á a motivação dos infermi (os Elfos renegados) para
perseguir Tikka, a Elfa fugitiva que os protagonistas encontram com a varinha
mágica, ela conta uma história maluca que fugiu porque não queria ajudar a
trazer o vilão dos mortos, que mandaram uma assassina para acabar com ela e bla
bla bla, mas durante o filme vemos a personagem de Noomi Rapace, que é quem
manda matarem Tikka, sendo uma Badass ninja Elfica que ainda tem uma dupla de
seguranças no mesmo nível e que no final diz que seu alvo é sua irmã! Então,
porque mandou outra pessoal (menos hábil) dar cabo da irmã e COM A SUA VARINHA MÁGICA? Falando nos Infermi,
uma coisa que ficou faltando foi uma aura ameaçadora do, apenas comentado,
senhor das trevas; pois vemos citações sobre ele nos muros pichados, o
preconceito com os Orcs se deve a ele, o temor da magia se deve a ele, o que
move o filme é a possibilidade de seu retorno, mas... Não o sentimos como uma
possível ameaça e isso diminui, ainda mais, as motivações dos vilões. Somado a
isso, ainda podemos falar da parca presença do “escudo da luz”, o grupo de
extremistas que luta contra o avanço dos elfos renegados e que tem como o
membro mais relevante, um sujeito que aparece do nada, todo sujo, brincando de
espada no centro da cidade e que só serve para explicar um pouco do que está
acontecendo, parecendo mais uma falha na edição (ou uma conveniência de
roteiro) do que uma participação que some à história.
Mas as pontas soltas, que parecem ter
escandalizado meio mundo, chegando a dizer o absurdo de que esse filme era PIOR
que “esquadrão suicida”, não me incomodaram em nada. Conhecendo o serviço de
streaming responsável pelo filme e o trabalho de Max Landis, enxerguei no pouco
aprofundamento sobre o passado do mundo onde a história se passa e os demais
jogadores da trama, como a força tarefa dos magos (que faz uma investigação
paralela sem muita relevância, mas que se sugere ter grande relevância), como a
porta aberta para um universo estendido, o que se mostrou provável ao lembrar
que a Netflix anunciou uma sequência, mesmo antes de o filme estrear e que pode
satisfazer quem não teve suas expectativas alcançadas com essa primeira
história.
“Bright” é uma história divertida e
inusitada que consegue segurar o expectador na cadeira por quase duas horas e tem
o potencial necessário para o surgimento do primeiro universo expandido com o
selo original Netflix. Apresenta alguns problemas de edição e continuidade, e, muita
coisa que a trama apresenta não fica totalmente exposta, mas, pensando bem, é
um filme onde um policial humano e outro Orc, lutam para não deixar uma varinha
mágica cair nas mãos de gangues de criaturas míticas, quem estava esperando um
novo “cidadão Kane” ou “poderoso chefão” deveria rever suas expectativas.
Então, se assim como eu, você também sempre teve a curiosidade de ver como os
mundos fantásticos evoluiriam até a era dos celulares e redes sociais, dê uma
chance a “Bright” e coloque um pouco mais de magia (e tiro, porrada e bomba) no
final de seu ano.
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