Quando eu
era adolescente li “um estudo em vermelho”, a primeira história
do Sherlock Holmes e me diverti muito com a descrição que Sir
Arthur Conan Doyle, através da boca do Dr Watson, fazia do
detetive. Segundo ele, Sherlock era totalmente focado em sua ciência,
sabendo tudo sobre plantas, em especial as venenosas, era tão hábil
que desenvolveu um teste sanguíneo para identificar criminosos (isso
no século 19), estudava a mente de bandidos para traçar paralelos,
estudava os tipos de terrenos e disfarces , em resumo era um gênio
de sua área e um profissional extremamente produtivo e eficaz
(exceto no livro do Jô Soares, diga-se de passagem).
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Nem tão competente, nem tão genial |
No entanto,
conforme a história avançava e se multiplicava em outros contos eu
ia observando que aquele foco extremo pelo trabalho ia se
transformando em obsessão e essa em frustração, a ponto do maior
detetive da literatura inglesa só conseguir relaxar através do uso
de drogas, sacrificando sua vida pessoal e até sua higiene (pelo que
se entende do filme do Guy Ritchie) e eu pensava: “Se fosse na vida
real, esse cara morreria de infarto ou de um AVC em menos de um ano,
tamanho stress que ele se cerca .”
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Cool e só |
Mal sabia eu que o padrão
de pessoa produtiva, mais de vinte anos após eu ler o livro, seria o
padrão Sherlock Holmes, onde a sociedade cobra um foco total em algo
que a gente faz, ignorando ou ridicularizando qualquer válvula de
escape, qualquer momento a parte, e, assim as pessoas, frustradas e
pressionadas pela obrigação social de nunca sair do personagem
produtivo e genial, vão buscando em derivados de valium, prozacs e
seus semelhantes, drogas menos exóticas do que as usados pelo famoso
detetive, o alívio que, simplesmente ser quem são as daria. E essa
falta de liberdade e certeza de uma obrigação desumana vai se
apresentando a uma geração inteira como a queda d'água onde
Sherlock encontrou o seu fim, nos puxando para baixo e nos fazendo
desaparecer na escuridão e ruido de quem nos coloca com últimos dentre seus interesses.
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Cachimbo da paz |
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